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É Desporto

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01 de Setembro, 2017

Yulia Lipnitskaya. A anorexia terminou a carreira da campeã olímpica

Rui Pedro Silva

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Brilhou nos Jogos Olímpicos de Sochi com uma medalha de ouro na patinagem artística. Menos de quatro anos depois, com 19 anos, a russa decidiu acabar a carreira por motivos de saúde e a mãe revelou que está a ser tratada para a anorexia. «Será que tenho de ter 37 quilos para sempre só para deixar toda a gente feliz?» 

 

Obsessão pela perfeição

 

Lipnitskaya é o apelido da mãe de Yulia. O pai, Vyacheslav, não passa de uma figura distante que abandonou Daniela grávida quando foi recrutado pelo exército e decidiu nunca mais voltar. Para a mãe da patinadora, foi uma prova de superação.

 

«Fez tudo pela filha. Acumulou vários empregos e até trabalhava no mercado. Lembro-me que voltava completamente congelada, mas não havia nada que não fizesse por Yulia», contou uma familiar à imprensa russa em 2014.

 

Os primeiros anos da sua vida não foram fáceis mas a patinagem foi o refúgio perfeito. Quando começou, tinha quatro anos e só muito dificilmente se conseguia manter em pé. O relato é da primeira treinadora, Elena Levkovets: «Levantava-se e caía, levantava-se e caía… e era assim a hora inteira. Um ano depois, já era a líder do grupo e patinava melhor e mais rápido do que todas as outras».

 

Yulia Lipnitskaya tornou-se uma revelação da patinagem em Ekaterinburg e não tardou até começar a competir em escalões acima do seu. Os bons resultados foram o mote necessário para que a família abandonasse a sua casa e procurasse outro ambiente em Moscovo, onde Yulia pudesse explanar todo o seu potencial.

 

Sinais de alerta

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Yulia nasceu a 5 de junho de 1998. Em 2013, ia fazer 15 anos e estava num dos momentos mais difíceis da sua vida. A russa habituara-se a ser obcecada com o detalhe, a não aceitar qualquer erro e a martirizar-se sempre que algo não corria bem.

 

Nos campeonatos nacionais juniores, não foi além do quinto lugar. Ficou furiosa. E os jornalistas sentiram isso na conferência de imprensa, quando perguntaram pelas razões para um resultado aquém das expetativas: «Estou a começar o período de crescimento e está a ser difícil para mim lidar com isto. Não está a ser fácil, alterou o meu corpo, a minha coordenação…»

 

A treinadora Eteri Tutberidze explicou, um ano depois, que 2013 foi um ano que pôs tudo em causa: «Não conseguiu lidar com a sua altura e o peso com a entrada na puberdade. Quando começou a ter o período e a sofrer alterações no corpo foi muito difícil para ela. Pensou até em deixar de competir, não compreendia o que estava a fazer».

 

As dificuldades não ficaram por aqui: o peso foi sempre a principal preocupação. «Está com muitas dificuldades, sofre com o peso todos os dias. Nunca encontrei isto no meu trabalho, simplesmente não consegue comer. Sinto muita pena que tenha de passar por isto mas não posso evitar. Ela é boa no que faz e quando precisa de perder peso come apenas um cereal para ter energia. É difícil e o peso baixa muito lentamente, 100 gramas por dia», dizia.

 

O brilho em Sochi-2014

 

O ponto alto da carreira de Lipnitskaya chegou em 2014, nos Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi. Tinha apenas 15 anos mas a federação confiou nela para fazer o programa completo e o programa curto na competição coletiva.

 

Resultado? Medalha de ouro para a Rússia e a patinadora mais jovem de sempre da era moderna (e a segunda na história) a conquistar um título. Podia pensar-se que Yulia estivesse feliz, mas a obsessão pela perfeição não a largava: «Espero não cometer o mesmo tipo de erros na prova individual». Antes, em competições anteriores, já tinha deixado sinais semelhantes: «Não sei como perdoar os meus erros. Se te permites errar, como é que consegues continuar?»

 

Os dias também não tinham sido fáceis. Na véspera, estivera até às duas da manhã na sala de controlo antidoping, forçada a beber litros de água para que pudesse ser recolhida a urina necessária.

 

Indiferentes à obsessão de Yulia, os russos vibraram com a sua nova coqueluche. Evgeni Plushenko, experiente patinador com uma longa história de grandes resultados, apelidava a benjamin de génio. «Tem um grande futuro para os próximos dez ou doze anos. Tenho orgulho por poder competir ao seu lado». Dias depois, Yulia não foi além do quinto lugar na prova individual. 

 

A patinadora podia estar frustrada mas continuou num pedestal e nem Vladimir Putin, presidente da Rússia, resistiu aos encantos de Yulia, deixando escapar um sorriso orgulhoso no momento da entrega de um título honorário.  

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A anorexia na base da decisão

 

O combate com o peso foi perdido. No último ano e meio, Yulia sofreu várias lesões que a afastaram da competição mas foi a anorexia que precipitou o fim de uma carreira curta mas brilhante.

 

A mãe Daniela confirmou a decisão a 28 de agosto: «Informou a sua decisão em abril, logo depois de ter voltado de uma clínica europeia onde fez tratamento contra a anorexia durante três meses».

 

Os problemas com o peso e o seu bem estar físico e emocional nunca a largaram. Em 2016, chegou mesmo a desabafar que estava a engordar só pelo ar que respirava e já este ano não gostou de ver os boatos de que estaria grávida. «Será que tenho de pesar 37 quilos para sempre só para deixar toda a gente feliz?» 

 

A patinagem artística passou a fazer parte do passado e a treinadora Tatiana Tarasova escolheu uma metáfora simples para analisar a carreira de Yulia Lipnitskaya: «É uma estrela. Algumas estrelas brilham durante muito tempo, enquanto outras brilham muito de uma vez e explodem. Ela iluinou tudo à sua volta. Desejo-lhe uma vida maravilhosa. Ela merece, é uma rapariga muito boa, inteligente e carinhosa.»

RPS

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