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É Desporto

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02 de Junho, 2017

Warriors vs. Cavs. Dois caminhos para construir uma superequipa

Rui Pedro Silva

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A terceira edição consecutiva de uma final entre Golden State e Cleveland estava anunciada desde o início da época e a falta de competitividade em cada conferência lançou a discussão sobre o método como as duas equipas aproveitaram as regras para formar superequipas. A forma como foram construídas, no entanto, tem várias diferenças. 

 

Ponto de partida

 

LeBron James jogou em Cleveland entre 2003 e 2010 sem conseguir ganhar qualquer título e com apenas uma presença na final. Durante este período, levou a equipa às costas e teve de se conformar com braços-direitos como Zydrunas Ilgauskas e um já debilitado Shaquille O’Neal. A eliminação nas meias-finais de conferência em 2010, frente a Boston, foi o toque de partida para uma nova abordagem. Onde quer que fosse, o melhor jogador do século XXI teria estrelas ao seu lado.

 

Depois de quatro finais consecutivas e dois títulos nos Miami Heat, com Dwyane Wade e Chris Bosh, regressou a Cleveland para cumprir a profecia que iria oferecer um título à cidade do seu estado-natal. Reencontrou uma equipa despedaçada, destruída pelo seu próprio abandono, que se impulsionava pela qualidade de Kyrie Irving – primeira escolha do draft seguinte à primeira época pós-saída de LeBron James. O passo seguinte foi garantir que Kevin Love trocava o frio do Minnesota pelo… frio do Ohio.

 

Numa paisagem termicamente mais agradável, os Golden State Warriors tornaram-se o vilão da NBA ao acolher Kevin Durant no último verão. A segunda escolha do draft da NBA em 2007 cansou-se de insucessos consecutivos em Oklahoma City e decidiu aproveitar o destino que maior percentagem de sucesso lhe permitia.

 

Assim chegamos a junho de 2017. Golden State Warriors (12-0) e Cleveland Cavaliers (12-1) não fizeram mais do que contornar obstáculos aparentemente imóveis durante os playoffs, levando jornalistas e adeptos ao desespero, desejando que pelo menos a final pudesse estar à altura das expetativas. Com exatamente uma semana de pausa entre o último jogo das finais de conferência e o primeiro da final da NBA (Golden State venceu 113-91 em Oakland), o termo superequipas voltou a estar na baila.

 

O que tem a NBA a ganhar com isto? Será que há futuro? As restantes 28 equipas veem neste cenário uma forma de aumentar a sua própria bitola ou apostar numa filosofia expectante para começar a desenhar um grupo para o futuro, desistindo de competir nos próximos anos?

 

Há mais do que uma forma de construir superequipas e as duas potências da NBA comprovam-no. O que se segue é uma análise aos jogadores que se equiparam para o primeiro confronto da final baseada em oito componentes: a forma como chegaram à equipa, o ano em que chegaram, qual foi a posição no draft, que idade têm atualmente, qual foi o salário do primeiro ano em que jogaram pela equipa, qual é o atual salário, se já foram all stars no passado e qual foi a percentagem de utilização no primeiro jogo.

 

As estrelas também se formam

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O núcleo duro dos Golden State Warriors que atingiu as primeiras duas de três finais foi diretamente do draft para Oakland. Stephen Curry (7.º em 2009), Klay Thompson (11.º em 2011) e Draymond Green (35.º em 2012) não chegaram à NBA como futuras estrelas garantidas mas souberam aproveitar a estabilidade de uma equipa com consecutivos fracassos para crescerem e transformarem-se naquilo que são hoje.

 

Dos 13 jogadores que disputaram o jogo 1 pelos Golden State Warriors, apenas um outro foi chegou diretamente no draft: Patrick McCaw no último verão (foi trocado no próprio dia depois de ter sido escolhido pelos Milwaukee Bucks). Se Sam Hinkie imortalizou a expressão “trust the process” nos 76ers, a verdade é que os Warriors foram percursores na habilidade de potenciar ao máximo os fracassos consecutivos para detetarem e desenvolverem estrelas no draft. Basta ver quais foram os nomes escolhidos imediatamente antes de Curry (Jonny Flynn), Thompson (Jimmer Fredette) e Green (Jae Crowder) para reconhecer o êxito da prospeção da equipa.

 

Em Cleveland, a situação merece um asterisco. LeBron James foi a primeira escolha do draft de 2003 – numa lotaria ganha pelos Cavaliers – mas tecnicamente o jogador está na equipa atualmente porque foi recrutado (deixou-se recrutar) como jogador livre em 2014, após a saída dos Miami Heat. De resto, há apenas mais dois casos de elementos que chegaram diretamente via draft: Kyrie Irving e Tristan Thompson, primeira e quarta escolhas em 2011, respetivamente.

 

Pelo caminho, os Cavaliers venceram a lotaria do draft em 2013 (Anthony Bennett) e 2014 (Andrew Wiggins), mas decidiram fazer um pacote que os incluía para garantir Kevin Love através de uma troca.

 

Esta é talvez a grande diferença entre as duas equipas: a superequipa de Cleveland tem apostado muito mais em trocas para formar o plantel do que a de Golden State. Em Oakland, só mesmo o rookie McCaw pode ser incluído nesse capítulo, enquanto o cinco inicial de Cleveland tem logo dois exemplos: JR Smith e Kevin Love. Numa segunda linha, também Iman Shumpert, Kyle Korver e Channing Frye foram obtidos via troca.

 

As peculiaridades dos jogadores livres

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Kevin Durant é a referência incontornável neste capítulo e uma das principais razões para a discussão sobre superequipas ter chegado ao ponto em que está. Depois de ter sido eliminado na final de conferência em 2016 pelos Golden State Warriors, numa série em que esteve a vencer 3-1, o extremo decidiu mudar de ares e juntou-se aos bicampeões de conferência.

 

O jogador de Washington é a cabeça-de-cartaz num conjunto de sete que chegaram à equipa nessas condições, onde se destacam também Andre Iguodala (desde 2013) e Shaun Livingston (desde 2014). Do lado de Cleveland, LeBron James é a figura, com o já referido asterisco, num grupo de apenas cinco jogadores.

 

Aqui, a balança tende a pender mais para o Oeste. Excetuando LeBron James, os Cavaliers nunca precisaram de pagar mais do que 1,5 milhões por ano para convencer um jogador.

 

É nesta altura que entra outra das críticas que se têm vindo a fazer às superequipas: os veteranos estão a abdicar de propostas melhores para terem uma oportunidade de se juntarem a uma superequipa e poderem conquistar títulos. David West e Deron Williams já foram all star no passado e estão agora a receber muito pouco em troca dessa oportunidade.

 

Posição no draft

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Esta componente serve mais como curiosidade do que qualquer outra coisa, mas ajuda a perceber o pedigree dos dois plantéis. Apesar de a esmagadora maioria dos 25 jogadores em questão não ter sido selecionada pelas equipas em questão, nota-se uma clara vantagem dos Cavaliers no historial dos seus elementos.

 

O cinco inicial de Cleveland é composto por duas antigas primeiras escolhas (LeBron e Kyrie), uma quarta (Tristan Thompson), uma quinta (Kevin Love) e uma 18.ª (JR Smith). E no banco têm mais uma segunda escolha (Derrick Williams), uma terceira (Deron Williams) e uma oitava (Channing Frye). O mais impressionante ainda é ver que dos 12 jogadores que se equiparam para o jogo 1, apenas Kyle Korver (51.º) não foi selecionado no top-20.

Do outro lado, só no cinco inicial os Warriors têm dois jogadores escolhidos na segunda ronda: Draymond Green (35.º) e Zaza Pachulia (42.º). Mais do que isso, Ian Clark e James Michael McAdoo até passaram pelo draft sem terem a honra de ouvirem o seu nome ser dito.

 

Os números reforçam a diferença: os 13 jogadores dos Warriors foram escolhidos em média na 27.ª posição (Clark e McAdoo foram contabilizados com 61.ª escolha para estas contas), enquanto os 12 jogadores dos Cavaliers foram selecionados em média na 12.ª posição.

 

Salários

 

Golden State e Cleveland tiveram de abrir os cordões à bolsa para garantir uma equipa tão rica em soluções mas os números demonstram que Dan Gilbert, proprietário dos Cavs, sofre mais. Não só tem o jogador mais caro (LeBron James recebe atualmente 30,9 milhões de dólares por ano), como em média paga quase mais três milhões a cada jogador: 10,3 contra 7,4.

 

A estatística que mais interessa a esta discussão de superequipa é outra: qual foi o primeiro salário que o jogador recebeu quando chegou à equipa. Porquê? Apesar de poder haver complexidades, como a dos veteranos que abdicam de receber mais ou de jogadores que só chegam com a época a decorrer e só custam… oito mil dólares (sim, Dahntay Jones, estamos a falar de ti), ajuda a compreender em que momento da carreira estavam e qual era o valor de mercado que tinham quando foram contratados.

 

Aqui, mais uma vez, os números de Cleveland estão mais inflacionados, com 6,3 milhões de dólares contra os 4,48 de Golden State. As diferenças tornam-se ainda mais relevantes se forem analisados apenas os cinco iniciais: Além de Kevin Durant, que está a receber 26,54 milhões de dólares na época de estreia, nenhum superou os três milhões – e Draymond Green, por vir da segunda ronda do draft, nem chegou ao milhão.

 

Do outro lado, LeBron James regressou em 2014 a receber 20,644 milhões, menos do que Durant, mas surgiu acompanhado de Kevin Love (15,719 milhões). É curioso perceber também que nenhum dos jogadores do cinco inicial recebeu menos de três milhões de euros na primeira época.

 

Uma questão de meritocracia

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Não há dúvida alguma que Golden State Warriors e Cleveland Cavaliers são duas superequipas sem concorrência na NBA, mas é relevante distinguir o caminho como cada uma chegou até onde está.

 

De um lado, está uma equipa que teve paciência e inteligência no momento de escolher e moldar os seus jogadores e aproveitou as vantagens desse rumo para garantir que tinha espaço suficiente para recrutar o jogador livre mais valioso do verão passado.

 

Do outro, está uma que renasceu dos destroços com a ginástica suficiente para acumular jovens promessas que teriam valor decisivo para juntar Kevin Love a LeBron James, para além de Kyrie Irving.

 

Qual das duas é mais criticável, se é, de alguma forma criticável? Há prós e contras em qualquer uma das situações e, atualmente, é a decisão de Kevin Durant que faz correr mais tinta. Não há resposta certa: é desporto, movimenta paixões (e milhões de dólares) e é mesmo assim.

 

RPS