Tomokazu Harimoto. Um cocktail genético no ténis de mesa
Cem é um belo número. É redondo e normalmente está associado à perfeição. Nos Jogos Olímpicos já foram atribuídas 100 medalhas no ténis de mesa. A modalidade estreou-se em Seul-1988 e o medalheiro não dá margem para grandes dúvidas: a China é rainha e senhora.
Das 100 medalhas atribuídas, 32 foram de ouro. A Suécia tem uma, a Coreia do Sul tem três e a China… a China tem as outras todas (28). Mas a nossa figura deste texto não é chinesa, é japonesa. E o Japão… bom, o Japão tem 4% das medalhas totais – duas de prata e duas de bronze.
Pode parecer pouco mas apenas a China, a Coreia do Sul e a Alemanha têm mais. Nem mesma a Suécia, que conseguiu um título olímpico, conseguiu superar as três no total. Mesmo assim, poderão estar a insistir neste momento: o que tem de especial Tomokazu Harimoto? Os genes são um cocktail explosivo desportivo… com traços chineses, claro está.
Zhang Ling, a mãe, e o pai, Zhang Yu, são ambos chineses e, nos seus tempos áureos, tiveram o ténis de mesa como ocupação profissional. Se o pai sempre foi mais discreto, a mãe chegou mesmo a representar a China nos Mundiais de Ténis de Mesa de 1995. Ou seja, oito anos antes de Tomokazu nascer.
Não havia grande dúvida de que, quando nascesse, Tomokazu não teria grande alternativa. E foi com dois anos que começou a praticar a modalidade que o levou aos Jogos Olímpicos de Tóquio com apenas 18 anos.
Até 2014, quando tinha onze anos, Harimoto manteve a nacionalidade chinesa apesar de ter nascido em Sendai e passar praticamente toda a vida no Japão. Mas depois tudo mudou. Por esta altura, a sua vida já tinha sofrido um grande abalo.
A família de Harimoto foi drasticamente afetada pelo terramoto de Tohoku, a 11 de março de 2011. O terramoto mais tsunami que ficará para sempre associado ao acidente na central nuclear de Fukushima durou seis minutos, provocou a morte de quase vinte mil pessoas e… destruiu a casa da família.
Com a vida a desabar, Tomokazu seguiu com a família para a China, de regresso a Sichuan, mas esteve por lá apenas um ano até decidir regressar. Em 2012, Harimoto tinha nove anos. Com 11 mudou de nacionalidade e aos 13 fez história pelo Japão.
Tomokazu Harimoto estava prestes a fazer 14 anos e tornou-se o atleta japonês mais jovem de sempre a participar num Mundial de Ténis de Mesa. E a partir daí, nada mais foi o mesmo. Hoje, Harimoto talvez seja uma das melhores esperanças nipónicas de furar o bloqueio chinês ao nível dos ouros. Difícil, sim, mas ao menos faz sonhar.
Com 18 anos, Tomokazu tem somado resultados animadores mas ainda não conseguiu furar verdadeiramente a hegemonia chinesa. Tem um segundo lugar nos Jogos Olímpicos da Juventude em 2018, mas nunca foi além dos quartos-de-final em Mundiais. Na Taça do Mundo tem presenças no top-3, tal como nos Jogos Asiáticos. No meio de algumas vitórias, talvez nenhuma tenha sido mais preciosa do que a que alcançou num torneio em Doha, a 11 de março deste ano, precisamente no décimo aniversário do terramoto.
«Não esqueci aquele 11 de março. Medo, surpresa, tristeza. As vidas que se perderam nunca mais serão recuperadas. O que posso fazer é continuar a jogar na plenitude da minha capacidade para dar esperança às pessoas de Tohoku e Miyagi. Queria muito ganhar esta prova para dedicar a vitória a toda essa gente. Espero que fiquem contentes», disse.
Tomokazu Harimoto podia ter apenas sete anos – estava a meses de fazer oito – mas percebeu não só a perda que tinha sido para a família e para a sua escola primária, como o rasto de destruição provocado pelo terramoto. A partir daí, sempre que entra em jogo, sabe que não está sozinho. Muito menos nuns Jogos Olímpicos disputados em casa. Será que fará a diferença?