Tom Daley. O sonho é sempre possível
Presença nos Jogos Olímpicos em Pequim, com apenas 14 anos, fez com que a jovem sensação se tornasse vítima de bullying na escola. A situação tornou-se insustentável e teve de mudar. Chega ao Rio de Janeiro à procura do título olímpico depois de ter sido bronze em Londres.
O nervosismo da estreia
Thomas Robert Daley é um talento precoce. Nascido a 21 de maio de 1994, começou a praticar saltos para a água em 2001 e com 14 anos, em 2008, tornou-se o atleta mais novo da comitiva britânica nos Jogos Olímpicos de Pequim.
Fazendo dupla com Blake Aldridge na prova de saltos sincronizados da plataforma de dez metros, Daley foi vítima de um ataque de nervos e não foi além do oitavo lugar na final. «Estou desapontado. Mas foi uma grande experiência e aproveitei muito. É tudo o que se pode pedir. Tivemos um dia mau. Tentei com que não fosse diferente de um outro dia qualquer mas havia muita pressão e estava nervoso. Não foi o meu dia», comentou.
Blake Aldridge, doze anos mais velho e a ter a sua última oportunidade de ganhar uma medalha não estava satisfeito e culpou o colega: «Sabia que dependeria de como ele saltasse. Não estive no meu melhor mas ainda assim fui melhor do que ele. Isso não é algo que costuma acontecer. Estava muito nervoso, mais do que alguma vez esteve. Como colega, foi difícil para mim tentar acalmá-lo.»
De jovem sensação a vítima de bullying
As palavras de Aldridge não fizeram mossa. Tom Daley tinha uma carreira pela frente e já apontava a uma medalha nos Jogos Olímpicos de Londres. Para ele, tudo voltaria ao normal, com mais um ciclo olímpico e a esperança de poder oferecer aos britânicos uma medalha a saltar em casa.
Estava enganado. Assim que regressou à escola, Eggbuckland Community College, começou a ser vítima de bullying. «Sempre ignorei o ‘Diver Boy’ e o ‘Speedo Boy’ quando voltei de Pequim, esperando que se fartassem e parassem.»
Mas não fartaram. Nem pararam nos nove meses seguintes. «Até os mais novos se juntaram. Chegou a um ponto em que pensei: ‘Que se lixe, não quero voltar para a escola!’.»
Estávamos em abril de 2009 e Daley decidiu dizer basta. O próprio diz que a situação nunca foi exagerada mas a repetição tornou-se insustentável: «Não me estão a afetar, apenas não consigo ter uma vida normal na escola como todos os outros.»
«Chamam-me nomes, atiram-me papéis, tiram-me o estojo. Depois dos Jogos Olímpicos ficou ainda pior. Toda a gente que passava por mim tinha algo negativo para dizer», lamentou na altura.
Efeito no desporto
A irritação de Tom Daley comeou a notar-se no desporto e foi aí que decidiu parar. O pai, Rob, defendeu-o: «Chegou ao ponto em que já não quer voltar para a escola. Tive que o tirar de lá e, muito provavelmente, vai ter de mudar.»
Perante as queixas, a diretora, Katrina Borowski, reconheceu que havia, de facto, «uma minoria de estudantes a agir de forma imatura». Mas não havia volta a dar, Tom Daley recebeu uma bolsa completa de outro colégio e saiu mesmo.
Curiosamente, mesmo antes deste episódio, já Tom Daley tinha dado a cara por uma organização de apoio a crianças e adolescentes.
«Quando as coisas se complicam, podes sentir que ninguém compreende. Mas não tens de ficar triste e sofrer em silêncio. Há sempre alguém que ouve os teus problemas e que te pode ajudar. Às vezes, quando estás triste e sozinho, é difícil acreditar que os teus sonhos se vão concretizar… mas podem», dizia o então adolescente de 13 anos.
Evolução nos saltos para a água
A estabilidade fora da competição fez com que os resultados na água aparecessem com maior naturalidade e logo nesse ano, em julho, sagrou-se campeão mundial em Roma, na prova de saltos da plataforma de dez metros.
O último ano do ciclo olímpico rumo a Londres ficou marcado pela morte do pai, vítima de um tumor cerebral diagnosticado seis anos antes. Se motivação faltasse, poder dedicar uma medalha olímpica ao pai, alguém que sempre fez questão de dizer que a felicidade do filho era o que mais importava, foi o toque final.
Em Londres, perante um pavilhão inteiro a apoiá-lo, Tom Daley conquistou o bronze. Na cerimónia de entrega de medalhas, o britânico ergueu-a bem alto enquanto olhava para cima, como que dedicando aquele momento ao apoio mais forte que teve enquanto cresceu.
«Essa pessoa é um homem»
Tom Daley tinha 19 anos quando voltou a ser tema de destaque em Inglaterra. No canal que tem no YouTube, divulgou um vídeo com cerca de cinco minutos a falar do novo relacionamento.
«A minha vida mudou radicalmente quando conheci uma pessoa nesta Primavera. Essa pessoa fez-me sentir tão feliz e tão seguro que tudo o resto parece perfeito. Essa pessoa é um homem», disse, garantindo que nunca tinha estado, nem podia estar, mais feliz.
O atleta recusou, ainda assim, o rótulo de homossexual. «Não quero colocar um rótulo porque agora estou numa relação com um homem, também sinto atração sexual por mulheres», garantiu.
«Nunca tinha sentido amor. Aconteceu tudo muito rapidamente. Tomou conta de mim ao ponto de não conseguir tirá-lo da minha cabeça», acrescentou sobre Dustin Lance Black, vencedor do Oscar de Melhor Argumento Original em 2008, com o filme Milk.
Ambição para o Rio de Janeiro
Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro chegam numa fase em que Daley e Black já estão noivos (desta vez o anúncio foi feito no Instagram). Com a vida pessoal a evoluir, também a desportiva quer dar o passo que falta.
«Continuo a ser o Tom. Continuo a querer ganhar o título olímpico no Rio de Janeiro pela Grã-Bretanha. Estou motivado como nunca», disse.
A estatística parece dar-lhe razão, pelo menos é o argumento que utiliza: «Os saltadores tendem a estar no pico entre os 22 e os 24. Eu vou ter 22, por isso estarei perto do meu. Estou mais forte, a saltar mais alto, a rodar mais rápido, a movimentar-me mais velozmente do que alguma vez. Ando apaixonado pelo mergulho.»
Tom Daley tem tudo para ter o mundo nas mãos. Como disse praticamente dez anos antes, mesmo que pareça impossível, os sonhos podem sempre ser concretizados. O inglês pode concretizar o seu no Brasil.
RPS