Ted-Jan Bloemen. Holandês ganhou asas com as cores do Canadá
Concorrência impediu que patinador pudesse evoluir da forma desejada quando competia pela Holanda. Depois de falhar a qualificação para Sochi-2014, decidiu mudar de cores e a recompensa chegou: foi campeão olímpico pelo Canadá nos dez mil metros da patinagem de velocidade em PyeongChang-2018.
Muitos galos numa capoeira
A Holanda conseguiu o pleno na prova dos 10000 metros nos Jogos Olímpicos de Sochi em 2014: ouro para Jorrit Bergsma, prata para Sven Kramer e bronze para Bob de Jong. Nos 5000 metros mais do mesmo: ouro para Sven Kramer, prata para Jan Blokhuijsen e bronze para Jorrit Bergsma.
Não é preciso ser um grande especialista em provas de patinagem de velocidade para perceber que a Holanda é, de longe, a maior potência nesta modalidade. Consegue ter uma supremacia tão ou mais vincada como a da Alemanha no luge ou na Noruega no cross-country. Por isso, com uma mão-de-obra abundante, não é de todo surpresa que Ted-Jan Bloemen não tenha tido espaço para representar o seu país de nascimento nos Jogos Olímpicos da Rússia.
Mas Bloemen estava insatisfeito. A época não tinha corrido de feição, mesmo ignorando a ausência olímpica, e sentia que não estava a ter o apoio necessário para evoluir da forma mais correta. Com tantos atletas de alto nível, a atenção dividia-se entre todos e por vezes parecia abandonado. Saltava entre equipas profissionais e perdia a motivação, tanto que chegou a ser campeão nacional de forma amadora, cansado do mundo do desporto e de tudo o que isso implicava.
Foi nessa altura que, com 27 anos, pensou que estava pronto para um novo desafio. O pai tinha nascido no Canadá e havia uma janela de oportunidade para pedir dupla nacionalidade e começar a competir pelo país norte-americano. «A razão pela qual estou a vir para Calgary é porque quero fazer algo entusiasmante para voltar a tirar prazer da patinagem», disse em junho de 2014.
O selecionador Bart Schouten ficou deliciado com a oportunidade: «Fixou o oitavo melhor tempo do mundo no ano passado e houve sete holandeses à frente dele. Se competisse pelo Canadá, seria facilmente o não-holandês mais rápido do mundo».
Rumo a PyeongChang-2018
Ted-Jan Bloemen nunca foi um patinador de grande sucesso enquanto competiu pela Holanda, falhando o assalto ao pódio e tendo problemas de saúde a afetá-lo nos momentos essenciais da sua carreira. Mas, como realçou Schouten, os patinadores de velocidade só atingem o seu pico de forma depois dos 30 anos e Ted-Jan ainda ia muito a tempo.
Mesmo que o novo canadiano dissesse que queria voltar a tirar prazer da patinagem de velocidade porque ainda não estava acabado, a verdade é que a margem para evoluir era enorme e tudo poderia acontecer em PyeongChang-2018, onde iria chegar com 31 anos. Mesmo no ponto, portanto.
A estreia foi quase perfeita. Foi medalha de prata nos 5000 metros, por apenas dois milésimos de segundo, e só ficou atrás de Sven Kramer, um velho conhecido. «Estes são os meus primeiros Jogos e já ganhei uma medalha. É algo muito importante e sinto-me muito orgulhoso e grato por ter uma equipa deste nível comigo», afirmou.
A cerveja no topo do bolo, como diria um alcoólico disléxico, estava guardada para a prova dos 10000 metros. Aí, o detentor da primeira medalha canadiana na modalidade desde 1932 deu ainda mais um passo em frente e conquistou o título, com direito a recorde olímpico. Melhor ainda, fê-lo batendo, entre outros, os rivais Sven Kramer e Jorrit Borgsma que, quatro anos antes, o tinham empurrado para fora dos lugares de qualificação.
A opção de começar a representar o Canadá foi validada. «Foi uma decisão difícil mas no final foi fácil porque sempre me senti em casa desde o início. Sempre tive gente fantástica ao meu lado», afirmou, apontando Bart Schouten como «o arquiteto do projeto».
«Não é apenas o treinador, é também quem se certifica de que estamos sempre satisfeitos fora do pavilhão», acrescentou.
Bart, mais humilde, rejeita os holofotes: «Não quero ficar com o crédito. O Ted cresceu muito durante os últimos quatro anos. Adorou a forma como foi recebido no Canadá e como a equipa o acolheu».