Stoichkov. O Hristo Rei de Sófia
Começou como adolescente irreverente numa equipa subjugada pelo Levski e chegou a ser banido do futebol depois da final da Taça em 1985. Quando regressou, foi a alma do CKSA rumo à recuperação da hegemonia na Bulgária. Em 1989/90, já depois de levar a equipa às meias-finais da Taça das Taças, marcou 38 golos no campeonato, foi Bota de Ouro e garantiu o salto para o Barcelona.
Início de carreira com «tentativa de assassinato»
Hristo Stoichkov tinha onze anos quando começou a jogar futebol nos escalões de formação no Maritsa Plovdiv, modesta equipa da cidade em que tinha nascido. Com um espírito irreverente e uma enorme dose de talento, não precisou de muito para dar nas vistas e começou uma carreira de estreias precoces.
O primeiro jogo a nível sénior aconteceu no terceiro escalão, pelo Hebros Harmanli, com apenas 16 anos. Durante duas temporadas, espalhou magia em campos ignorados, com pouca gente e longe do estrelato do futebol ocidental. Mas, depois de dez golos em 1983/84, captou a atenção dos olheiros do CSKA e deu o salto para a capital.
A época de estreia foi tumultuosa. Hristo não era apenas um jogador a passar pela fase irreverente da adolescência. Era mesmo assim. Tivesse 19, 29 ou 39 anos, a personalidade era vincada, não virava a cara ao confronto e preferia resolver os problemas com as suas mãos do que fugir e deixar os mais experientes decidir por si.
A tendência para o conflito correu mal na final da Taça da Bulgária em 1985, no dérbi entre o CSKA e o Levski. Stoichkov tinha 19 anos mas foi titular no jogo que acabou numa batalha campal e provocou a dissolução das duas equipas (mudança de nomes) e castigos severos para cinco jogadores, que foram banidos para sempre do desporto. Hristo Stoichkov, que tinha agarrado o pescoço a Spasov durante o jogo e escapado a expulsão, foi um deles.
«Senti que tinha sido morto. Não sei por que me castigaram, provavelmente porque era o mais novo. Podiam ter-me destruído», escreveu na sua autobiografia anos mais tarde.
Aproveitar uma segunda oportunidade
A dureza dos castigos mereceu protestos desde uma primeira fase mas nada foi mais útil do que a aproximação do Mundial do México. O partido comunista búlgaro queria evitar uma vergonha na fase final e decidiu amnistiar os jogadores uns meses mais tarde.
Stoichkov ainda não era chamado para a seleção mas beneficiou da decisão e fez tudo para aproveitar a segunda oportunidade que lhe tinha sido dada. O regresso aos relvados deu-se a 30 de abril de 1986 e poucos dias depois marcou na final da Taça do Exército Soviético, começando a consolidar um espaço no CSKA.
A evolução do jovem talentoso não deixou margem para dúvidas. O CSKA estava em processo de renovação, depois de um início de década brilhante que tinha incluído umas meias-finais da Taça dos Campeões Europeus em 1982, e Stoichkov assumia-se como uma das cabeças de cartaz, ao lado de outras promessas como Emil Kostadinov e Lyuboslav Penev.
O CSKA, então conhecido por Sredets na sequência dos castigos de 1985, recuperou a hegemonia do futebol búlgaro. Foi campeão em 1987, 1989 e 1990, e venceu a Taça em 1987, 1988 e 1989. Hristo Stoichkov cresceu com a equipa e tornou-se imparável.
Ascensão meteórica
A carreira estava numa fase em que as etapas eram ultrapassadas com facilidade. A 23 de setembro de 1987 estreou-se pela seleção, contra a Bélgica, e lançou as primeiras raízes de uma experiência que teria o cúmulo nas meias-finais do Mundial em 1994.
A nível interno, não havia oposição capaz de fazer frente ao génio de Stoichkov. Com Sófia e a Bulgária conquistadas, ficava a faltar seduzir o resto da Europa. Para isso, era preciso chegar longe nas competições da UEFA, algo que só aconteceu verdadeiramente em 1988/89.
Na época em que foi o melhor marcador do campeonato búlgaro pela primeira vez (23 golos), Stoichkov conduziu o CSKA às meias-finais da Taça das Taças. Ronda após ronda, o génio foi fazendo a diferença e, quanto mais a dificuldade aumentou, mais o talento pareceu sobressair.
Depois de um golo em cada uma das primeiras rondas (Inter Bratislava e Panathinaikos), Stoichkov elevou a fasquia nos quartos de final contra o Roda: marcou um em casa, um fora e o derradeiro penálti da equipa no desempate. Tudo corria na perfeição mas o adversário seguinte seria temível.
A estreia na Catalunha
Stoichkov apresentou-se ao Camp Nou pela primeira vez a 5 de abril de 1989. O Dream Team de Cruijff era demasiado forte e ia a caminho da conquista do troféu, mas o búlgaro de 23 anos fez questão de deixar a sua marca no estádio que viria a ser seu. Depois de inaugurar o marcador aos 24 minutos, marcou um segundo golo aos 67’, sendo incapaz de evitar a derrota por 4-2.
Na segunda ronda, voltou a marcar mas o Barcelona foi novamente mais forte e venceu por 2-1. Para o CSKA, a campanha ficou por ali, para Stoichkov foi apenas o início de uma nova etapa na glória pessoal. Tinha-se destacado frente a uma das melhores equipas do mundo e demonstrado que podia jogar contra e entre os melhores. Acabara como melhor marcador da prova (sete golos) e seria uma questão de tempo até dar o salto.
A época seguinte comprovou que a Bulgária era demasiado pequena para a qualidade de Stoichkov. Com 38 golos no campeonato (melhor marca na história búlgara até hoje), não só levou a equipa ao segundo título consecutivo como conquistou a Bota de Prata europeia, dividida com Hugo Sánchez (Real Madrid). A campanha europeia, na Taça dos Campeões, não atingiu o sucesso da época anterior, ficando-se pela eliminação nos quartos de final frente ao Marselha de Waddle e Papin.
O Barcelona decidiu avançar para a sua contratação no final da temporada por 400 milhões de pesetas (2,4 milhões de euros). O brasileiro Aloísio tinha saído para o FC Porto e ficara uma vaga de estrangeiro por ocupar. Assim, Stoichkov juntou-se a Ronald Koeman e Michael Laudrup e os catalães partiram para uma era de futebol espetáculo que incluiu o primeiro título europeu (1992).
Stoichkov, o Hristo Rei de Sófia, era agora maior do que alguma vez imaginara. E estava apenas a começar…