Spiridon Louis. O homem que salvou o orgulho grego
Especial Jogos Olímpicos (Atenas-1896)
A participação helénica no atletismo nos Jogos Olímpicos de 1896 foi uma desilusão para os anfitriões e nada seria pior do que nova derrota na prova da maratona. Spiridon Louis, um aguadeiro de profissão, entrou em ação e deixou mais de 100 mil pessoas ao rubro ao cumprir a distância em menos de três horas.
A primeira edição dos Jogos Olímpicos da era moderna contou com 311 atletas de um total de 14 países. O evento estava apenas a arrancar e não surpreendeu ninguém que a Grécia dominasse a lista de presenças com um total de 230 homens (não havia mulheres).
A esmagadora maioria nas presenças deveria apontar para uma superioridade a nível de medalhas, mas a Grécia foi falhando onde mais se esperava dela. Os Estados Unidos demonstraram desde logo ser a principal potência olímpica, acabando com onze títulos num total de 20 medalhas. A Grécia conquistou 46 mas não foi além de dez títulos. Um deles, porém, foi o mais saboroso.
A participação da Grécia no atletismo foi uma autêntica desilusão. Os norte-americanos conquistaram nove das doze provas e o australiano Edwin Flack fez a dobradinha com triunfos nos 800 e 1500 metros. O segundo lugar no lançamento do disco – uma das provas com maior tradição helénica – foi um duro golpe e dirigiu todas as atenções para a inédita prova da maratona. As esperanças de um título apontavam todas para aí.
A prova tinha Grécia escrita por todo o lado. Idealizada pelo francês Michel Bréal, a competição foi idealizada para render homenagem à história do país, nomeadamente quando o soldado Fidípedes percorreu a distância entre Maratona e Atenas para informar os atenienses que a batalha contra os persas havia sido ganha.
O fim trágico – com a morte por exaustão – foi ignorada. Os atletas teriam uma preparação diferente e o objetivo era homenagear os esforços do passado… de 490 antes de Cristo. Houve 17 concorrentes à partida: 13 eram gregos. Entre os quatro estrangeiros havia os três primeiros classificados dos 1500 metros – com destaque para Edwin Flack e Albin Lermusiaux – e um húngaro chamado Gyula Kellner, que havia corrido a distância de 40 quilómetros numa prova no seu país.
No estádio, o rei Jorge e mais de 100 mil espetadores foram acompanhando o desenrolar dos acontecimentos com muita ansiedade e alguma desilusão. Afinal, as notícias que iam chegando – e que se espalhavam rapidamente – contavam que Flack e Lermusiaux estavam na frente.
Spiridon Louis, habituado a correr grandes distâncias, fez uma prova tranquila, de trás para a frente. Estava tão calmo que, conta a lenda, chegou inclusivamente a parar para receber metade de uma laranja e um copo de conhaque do sogro. Precisava de recarregar baterias e estava mais do que confiante de que iria terminar no primeiro lugar.
Tinha razão. Um a um, os estrangeiros da frente sucumbiram ao desgaste, rendidos ao facto de que correr 40 quilómetros não é o mesmo que ganhar uma prova de 1500 metros. Quando cruzou a meta, em duas horas, 58 minutos e 50 segundos, Spiridon Louis tornou-se imediatamente um herói nacional.
Podia pensar-se que o resto da sua vida seria vivida à sombra dos seus feitos, mas isso esteve longe de acontecer. Trinta anos depois, por exemplo, chegou mesmo a ser preso por falsificar documentos militares. Em 1936, quatro anos antes da sua morte, foi convidado por Adolf Hitler para marcar presença nos Jogos Olímpicos de Berlim. Louis foi o porta-estandarte da comitiva grega e ofereceu um ramo de oliveira ao ditador nazi.