Simon Kammerlander. Conversa de ocasião abriu caminho para os Olímpicos
Provas de combinado e de downhill tiveram uma nacionalidade que saltou à vista. Atleta boliviano nasceu na Áustria e começou a representar outras cores quase por acaso. O sucesso é escasso mas a quem é que isso interessa?
A toda a velocidade para a Bolívia
Simon Breitfuss Kammerlander é atleta olímpico pela Bolívia por causa do pai. Não, apesar de ser a interpretação mais fácil, o pai não é sul-americano. Na verdade, o pai era um piloto profissional de corridas que viajava frequentemente para a América do Sul e costumava levar o filho.
Na maior parte das vezes, o destino era a Argentina mas uma vez foi parar à Bolívia. Foi aí que, durante uma feira de rua, Simon começou a conversar com desconhecidos. A conversa, como tantas outras em eventos do género, era apenas de ocasião mas mudou a vida de Simon para sempre.
O austríaco estava a perguntar pela montanha mais próxima, uma que estava ali ao alcance dos olhos, sem ter noção de que estava a conversar com membros da Federação Boliviana de Esqui. Simon era um apaixonado pelo desporto mas o sonho de poder competir pela Áustria não passava de uma miragem. Apesar de tudo, a janela boliviana demorou algum tempo até ficar aberta.
Processo demorado e conturbado
Quando o convite chegou, Simon percebeu que representar a Bolívia iria ser muito mais complicado do que se costuma ver na televisão, em que federações fazem tudo com o apoio dos governos para acelerar o processo. Com Simon não foi assim, pelo contrário.
«Perdi a conta ao número de vezes que tive de ir ao departamento de imigração, às fotocópias que tive de tirar e aos formulários que tive de preencher», desabafou este ano ao lembrar o processo que durou mais de seis anos.
Simon reconhece que noutros tempos talvez tudo pudesse ter sido mais simples, mas agora não: «Talvez tivesse tido a sorte de ter alguém a fazer tudo por mim e a contornar a legislação, mas agora é tudo feito com base em documentos e registos. Fica muito difícil», explicou.
O atleta mudou-se mesmo para a Bolívia e esteve lá a viver e a estudar até finalmente receber a nacionalidade em 2015, ano em que começou a representar as cores bolivianas nos principais eventos.
História em PyeongChang-2018
A Bolívia está nos Jogos Olímpicos de Inverno pela primeira vez desde 1992. Simon foi o porta-estandarte mas teve a companhia de outro naturalizado: um finlandês do cross-country chamado Timo Juhani Grönlund.
«É uma grande oportunidade para promover os desportos de inverno como uma boa alternativa para o povo boliviano», disse Juan de Dios Guevara, o chefe da comitiva do país andino. O presidente do Comité Olímpico Boliviano seguiu a mesma lógica de pensamento: «É uma satisfação voltar a ter atletas nestes Jogos Olímpicos. O objetivo é que o olimpismo possa crescer, temos de aproveitar a estância de Charquini para atrair mais esquiadores».
Simon vê com agrado a possibilidade de servir como modelo e pioneiro do esqui alpino na Bolívia mas relembra que a prioridade é conseguir bons resultados. Algo que falhou: foi desqualificado na prova combinada ao falhar a inspeção antes da partida no slalom. Mais tarde, foi 47.º (em 57) na prova de downhill. Esta madrugada vai competir no Super-G.
Ainda assim, nem tudo é mau. O atleta gostou de poder ter uma comitiva a torcer por ele, uma vez que costuma estar sozinho com o treinador, e confessou que se sente «orgulhoso e privilegiado por competir com a bandeira boliviana».
Quando a azáfama de PyeongChang passar, vai continuar a sua vida dividida: na Europa durante o Inverno a competir e na Bolívia no resto do tempo. «A forma como conjugo as duas coisas é perfeita», reconhece.