Salum Kashafali. Da guerra civil em África ao ouro pela Noruega
«Nem sei o que dizer. Vim do nada. Andava a pedir dinheiro na rua.» Salum Ageze Kashafali é o novo campeão paralímpico dos 100 metros em T12 (categoria destinada para atletas com deficiência visual) e não podia sentir mais o peso do caminho.
Não foi o ouro no final que o afetou, foi sentir a jornada chegar ao fim. «Mudei-me para a Noruega como um refugiado. Passei por tanta coisa, por balas e por fome. Tornar-me um dos melhores do mundo significa muito muito para mim. Vale a pena. Vale a pena vir do zero e alcançar alguma coisa. É a melhor forma de pôr as coisas: tudo é possível».
Salum Kashafali nasceu na República Democrática do Congo (ex-Zaire) a 25 de novembro de 1992. Com apenas 12 anos foi-lhe diagnosticada uma lesão que provocaria a perda da visão a curto prazo. Por esta altura, estava na Noruega há apenas um ano depois de escapar à guerra civil.
«Foi muito difícil a mudança para a Noruega porque só sabia falar francês e swahili. Foi muito difícil adaptar-me mas conseguiu safar-me e no final tive muitos amigos a ajudar-me. Ir para a Noruega salvou-me a vida», garantiu.
A vida na República Democrática do Congo era muito difícil daquela que acabou por encontrar em Bergen. «Não se tratava de correr ou de jogar futebol. As minhas prioridades eram encontrar comida e sobreviver, por isso chegar à Noruega foi como ganhar a lotaria e tornar-me bilionário. Nunca, nem nos meus sonhos mais impossíveis, consegui imaginar que teria um telhado por cima da cabeça e comida na mesa todos os dias», disse.
O desporto tornou-se uma parte comum da sua vida assim que chegou à Noruega. O futebol foi a primeira escolha mas com a perda gradual de visão concentrou-se no atletismo. «Cheguei a um ponto em que já não via nada, por isso tentei correr e… vencei a minha primeira corrida».
O resto é uma história de sucesso. Salum Ageze Kashafali começou a competir pela Noruega em 2019 e desde então já foi campeão do mundo, campeão da europa e campeão paralímpico com um novo recorde mundial: 10,43 segundos.
Nada mau para quem é agora professor de matemática em Bergen. Haverá alguém melhor para explicar que tudo é possível mesmo quando as probabilidades parecem estar todas contra?