Phil Jackson. O homem sem dedos para tantos anéis deixou de ter mãos para os Knicks
Foi campeão duas vezes como jogador e onze como treinador. Passagem para os escritórios em Nova Iorque foi feita em 2014 e desde então somou fracassos. O Zen Master perdeu a paciência com Porzingis – o grande legado que deixa aos Knicks – e os proprietários sentiram que era hora de terminar a ligação. Sem glória e como um velho teimoso.
A teimosia é uma virtude?
Phil Jackson nasceu no Montana em 1945. Vai fazer 72 anos a 17 de setembro. O estado tantas vezes esquecido dos Estados Unidos fica a, mais curva menos curva, 7840 quilómetros de Belém, em Portugal. Mas nem essa distância impediu Phil Jackson de se transformar num Velho do Restelo.
O Zen Master já não é o mesmo. Muito pouco resta do homem que foi jogador da equipa dos New York Knicks que venceu os títulos em 1970 e 1973. E também já não é muito o que sobra do treinador que somou uma impressionante marca de onze títulos, espalhados entre Chicago Bulls (seis com Michael Jordan) e LA Lakers (cinco com Kobe Bryant).
O basquetebol evoluiu, Phil Jackson não acompanhou. Quando, em 2014, James Dolan o contratou para assumir o cargo de presidente dos New York Knicks, as primeiras dúvidas surgiram. Seria capaz de fazer uma transição com sucesso e perceber que a fórmula de sucesso do passado, com a obsessiva aposta na tática do triângulo, estava ultrapassada?
Phil Jackson não quis saber. Conseguiu ser fiel a si mesmo, traindo as expetativas dos milhões de adeptos que compõem uma das maiores legiões de fãs do desporto nos Estados Unidos. Foi teimoso, caiu numa espiral de erros, cada vez mais imperdoáveis, e a última gota de água fez com que a gestão dos Knicks percebesse que estava na hora de pôr fim à loucura.
«Depois de cuidadosa consideração, chegámos [Knicks e Phil Jackson] a um entendimento mútuo de que os Knicks vão seguir numa direção diferente», afirmou James Dolan, num comunicado divulgado pela equipa, acrescentando que «Phil Jackson é um dos mais conceituados e premiados indivíduos na história da NBA».
Do outro lado, o antigo presidente da equipa disse que os Knicks terão sempre um lugar especial no seu coração. «Esta equipa e esta cidade lançaram a minha carreira na NBA. Estarei sempre em dívida para com eles. Estou grato ao senhor Dolan por me ter dado a oportunidade de regressar. Esperava, claro, ajudar a equipa a conquistar outro título e, como alguém que valoriza tanto a vitória, estou muito desapontado por não o ter conseguido fazer».
A novela Porzingis
Junho de 2015, dia 25. Os Knicks tinham a quarta escolha no draft da NBA depois de uma época para esquecer com apenas 17 vitórias em 82 jogos. Numa geração com nomes como Karl-Anthony Towns, D'Angelo Russell e Jahlil Okafor - as três primeiras escolhas - Phil Jackson apostou num desconhecido chamado Kristaps Porzingis.
O letão de 19 anos foi um balde de água fria entre os adeptos dos Knicks que assistiam ao evento em Brooklyn. E assobiaram. Assobiaram muito. Assobiaram como se o diabo tivesse acabado de chegar a Phil Jackson tivesse tomado a pior decisão que poderia tomar no seu cargo. A vitória foi para o presidente.
Porzingis não precisou de muito tempo até seduzir e convencer adeptos dos Knicks e de basquetebol. De desconhecido passou a unicórnio, um jogador sensacional, com uma margem de progressão enorme, capaz de ressaltar, defender o cesto e lançar de três. Era o perfeito poste da era moderna e tinha sido escolha, arriscada, de Phil Jackson.
Mas a lua-de-mel foi sol de pouca dura. Menos de dois anos depois, Porzingis está também umbilicalmente ligado ao fim do cordão que associava Jackson aos Knicks. Em abril, após falharem os playoffs, os Knicks marcaram entrevistas de fim de época com os jogadores e Porzingis faltou, foi direto para a Letónia. Estava desiludido com o desenrolar das decisões de Jackson, sobretudo pela forma como lidava com Carmelo Anthony.
Incompatibilidades fatais
Os últimos dois meses transformaram a vida de Phil Jackson numa espiral imparável de acontecimentos negativos. Porzingis saiu zangado e Carmelo Anthony foi perdendo valor a cada declaração pública do presidente. A cláusula contra trocas reduziu a margem de manobra do Zen Master a lidar com a maior estrela da equipa e o buyout (acordo para rescindir contrato mediante o pagamento de parte ou totalidade do valor remanescente) tornou-se a possibilidade mais forte.
De repente, tudo começou a cair como um baralho de cartas. Phil Jackson nem esteve mal nos drafts - Willy Hernangómez, escolhido em 2015, também mostrou qualidade - mas o resto foi um pesadelo de gestão e de relações públicas.
Além da relação degradada com Carmelo Anthony, também todo o caso Porzingis deixou a desejar, atingindo o cúmulo quando deu a entender, em vésperas do draft, que estava a equacionar uma troca, desde que a recompensa valesse a pena. Os interessados fizeram fila mas, de acordo com vários relatos, o negócio nunca esteve perto de acontecer. Para os adeptos, contudo, isso pouco interessou: a escassa margem de confiança em Phil Jackson tinha desaparecido.
A cereja no topo do bolo foi, ainda assim, a revelação de um candidato ao draft de que Phil Jackson adormecera várias vezes durante uma sessão de observação que fez para os Knicks. Foi apenas mais uma gota de água num copo a transbordar.
Hoje, quase uma semana depois do draft, em que os Knicks escolheram um jovem francês chamado Frank Ntilikina, Phil Jackson está sem emprego. Muito possivelmente para sempre. A ribalta de outrora transformou-se numa porta pequena. Em Nova Iorque não deixará saudades mas, quem sabe, ainda virá a recolher os louros de uma eventual geração de ouro com Ntilikina, Porzingis e Hernangómez em destaque.
RPS