Oksana Chusovitina. A ginasta que tem idade para ser mãe das adversárias
O Rio de Janeiro marca a sétima participação olímpica da atleta que nasceu no Uzbequistão mas que também já competiu pela União Soviética, Comunidade dos Estados Independentes e Alemanha. Tem 41 anos e não há nada que o desporto não lhe tenha dado, inclusive o casamento. O que faz, faz por amor.
Velhos são os trapos
Chegar aos Jogos Olímpicos com 41 anos não é um feito especial por si só. Em modalidades como golfe, tiro, equestre e vela, a experiência até pode ser uma mais-valia. Mas depois há a ginástica artística, a modalidade da qual, por norma, saem os medalhados mais jovens.
É aqui que entra a história de Oksana Chusovitina. Aos 41 anos, será a mais velha ginasta na história dos Jogos Olímpicos. Comparando com a principal figura da modalidade no Rio de Janeiro, Simone Biles, é 22 anos mais velha. Quando a norte-americana nasceu, já Oksana tinha participado em Barcelona-1992 e Atlanta-1996.
A longevidade de Oksana é tanta que o historial desportivo está dividido por quatro representações. Em 1991, sagrou-se campeã do mundo pela União Soviética mas no ano seguinte, nos Jogos em Espanha, teve de representar a Comunidade dos Estados Independentes. «Foi fantástico ver aquela cerimónia de abertura com os meus próprios olhos. Quando a seta foi lançada para acender a pira, não queria acreditar. Continua a ser a minha melhor memória», recorda.
Depois, já com um título olímpico, começou a competir pelo Uzbequistão. As condições de treino após a desintegração da União Soviética não eram as melhores mas Oksana nunca pareceu incomodada e somou participações em Atlanta-1996, Sydney-2000 e Atenas-2004.
2002, o ano da mudança
Oksana casou com um lutador uzbeque, Bakhodir Kurbanov, em 1997, depois de o ter conhecido durante os Jogos Asiáticos de Hiroshima, em 1994. Foi também nessa competição que, em 2002, tiveram a pior notícia possível.
O filho Alisher, quase a fazer três anos, tinha sido diagnosticado com leucemia. Sem outra solução, a família mudou-se para Colónia, na Alemanha, à procura do melhor tratamento. O problema era os 120 mil euros que o hospital exigia antes de começar.
Oksana e Bakhodir não tinham seguro nem o dinheiro necessário. Felizmente para eles, Peter Brüggemann, presidente do hospital da Universidade de Colónia e pai de uma ginasta, intercedeu por eles e garantiu que o valor seria pago.
Foram organizadas várias campanhas de angariação de dinheiro e o clube de fãs da ginasta nos Estados Unidos foi um dos maiores contribuidores para a verba total.
Competir pela Alemanha
Oksana Chusovitina nunca abandonou os treinos e em 2006, depois de pedir a cidadania alemã, começou a competir pela seleção germânica. Foi nessa condição que, em 2008, conquistou a primeira medalha individual nos Jogos Olímpicos – prata nos saltos de cavalo. Tinha 33 anos.
A subida ao pódio foi rapidamente ofuscada por outro acontecimento. Pouco tempo depois, recebeu um telefonema: o filho tinha vencido a leucemia. «Foi a melhor notícia de sempre», garante.
«Nada mais importa quando se ouve uma notícia destas. Nenhuma medalha se pode comparar a este tipo de telefonema. Quando o teu filho está saudável, não se pode comparar com qualquer tipo de feitos desportivos.»
O fim de carreira parecia próximo mas sentiu uma nova energia. E foi com ela que viajou até Londres para os Jogos Olímpicos de 2012.
Adeus e o regresso
O quinto lugar nos saltos de cavalo desempenhou um papel fundamental na ideia que tinha para o adeus. «À noite, disse a toda a gente que tinha sido a minha última prova. Na manhã seguinte, acordei e tinha mudado de ideias», relembra, em declarações à ESPN.
«Foi literalmente isso que aconteceu. Acordei, deitada na cama, a pensar que não tinha alcançado tudo o que podia e a sentir que ainda conseguia fazer mais. Foi por isso que comecei a treinar para mais uns Olímpicos, por achar que há mais em mim.»
O caminho para a sétima participação foi feito a representar o Uzbequistão novamente, com um quinto lugar nos Mundiais em 2013 e a medalha de prata nos Jogos Asiáticos em 2014, ambos na especialidade de saltos de cavalo.
O Rio de Janeiro chega com 41 anos mas há quem já tenha perdido o fio à meada. Campeã olímpica em 2008, a ginasta Shawn Jonhson confessa que a longevidade é inacreditável: «Já ninguém sabe a idade dela porque toda a gente pensa que anda aqui há um milhão de anos. É incrível, é uma lenda.»
O que muda aos 41?
Oksana Chusovitina não é a mesma ginasta que era quando se deslumbrou com a cerimónia de abertura em 1992. O treino também está diferente.
«Por esta altura, não preciso de muito treino físico. Faço muito treino mental. Tenho a memória muscular que o meu corpo desenvolveu ao longo dos anos. Normalmente passo duas a duas horas e meia no ginásio», explica.
«E depois visualizo exatamente como os movimentos têm de ser feitos. Faço-os na minha cabeça e quando chego ao ginásio, toda a preparação mental que fiz depois do pequeno-almoço ou a andar por casa é transferida para o ginásio. Sei exatamente o que tenho de fazer.»
A lógica parece confirmar que estes serão os últimos Jogos Olímpicos mas Oksana não é clara: «Não vou dizer que sim nem que não.»
«Sinto que de cada vez que compito, deixo uma parte de mim para trás. As pessoas vão lembrar-se de mim, e vão fazê-lo durante muito tempo por causa da minha longevidade. É a melhor coisa que posso deixar para trás», realça.
Oksana Chusovitina tem tudo o que precisa. O filho é saudável (gosta mais de basquetebol do que de ginástica) e em competição não falta nada: «Tenho os meus títulos mundiais e as minhas medalhas olímpicas. Não preciso de mais nada a não ser do meu amor pelo desporto.»
RPS