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É Desporto

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22 de Agosto, 2016

O balanço possível de Portugal nos Jogos Olímpicos

Rui Pedro Silva

Telma Monteiro

Portugal sai do Rio de Janeiro com uma medalha de bronze e mais dez classificações de finalistas que valeram diploma olímpico. De acordo com as contas que o Comité Olímpico nacional faz a cada quatro anos, os Jogos de 2016 tiveram a segunda maior pontuação de sempre (41 pontos, apenas atrás dos 44 de Atenas). Mas será correto dizer que foi também a segunda melhor de sempre? 

 

Otimismo moderado

 

A crítica ao diploma olímpico foi recorrente durante as duas últimas semanas. De facto, os Jogos Olímpicos são determinados por quem ganha medalhas. E aí, Portugal venceu apenas uma medalha de bronze. Contra uma de prata em Londres. Contra uma de ouro e uma de prata em Pequim. Contra duas de prata e uma de bronze em Atenas. E duas de bronze em Sydney. E uma de ouro e uma de bronze em Atlanta.

 

Se as contas se fizeram apenas pelo valor das medalhas, esta foi a pior participação de Portugal em Jogos Olímpicos desde Barcelona-1992, quando nem uma houve para amostra. Mas será justo dizê-lo dessa forma também?

 

Não é. Há inúmeros fatores intangíveis que influenciam a nota final dada ao desempenho nos Jogos Olímpicos. A mais importante será sempre avaliar se os resultados foram adequados às expetativas existentes. E aí, antes desta edição, os responsáveis tinham colocado a fasquia em «uma ou duas».

 

O poder e o dever

 

Telma Monteiro ganhou uma medalha. Nelson Évora podia ter conquistado outra. Fernando Pimenta em K1 1000 também, tal como Emanuel Silva e João Ribeiro em K2 1000. E Rui Bragança no taekwondo. E Nelson Oliveira no contra-relógio. Podiam, mas não ganharam.

 

Esta é outra questão primordial: ter atletas que podiam ter conquistado medalhas é muito diferente de ter atletas que o deviam ter feito. Der por onde der, na história de Portugal em Jogos Olímpicos, só tivemos uma atleta que se enquadrasse nesse ângulo: Vanessa Fernandes. E a triatleta correspondeu, muito bem, com a prata.

 

Fernando Pimenta não entra nesta equação? Não, não entra, apesar de ter sido campeão europeu em junho de K1 1000 e K1 5000. O problema é mesmo esse: não podemos julgar que resultados passados determinam o que quer que seja. E é perigoso fazer avaliações sem saber o que está por trás. Os medalhados no Rio de Janeiro estiveram em Moscovo em junho? Não. E em pré-Olímpicos, a preparação dos atletas é toda igual? Também não.

 

É quase como alguém que não liga muito a futebol achar agora que Portugal tem de vencer o Mundial da Rússia, ou pelo menos estar na final, só porque venceu o Europeu em França.

 

O canoísta podia, perfeitamente, ter conquistado uma medalha. Era, possivelmente, o atleta com maior probabilidade de dar uma medalha. Mas não deu. Desilusão? Sobretudo pessoal. Fracasso para quem vê? Não devia ser.

 

A história das condições

 

O ciclo é sempre o mesmo. De quatro em quatro anos, o povo exige medalhas, os atletas respondem com a exigência de condições. O assunto é, mais uma vez, delicado.

 

Foi por falta de condições que Fernando Pimenta, Emanuel Silva e João Ribeiro não venceram medalhas? Não acredito. Julgo que, no fim do dia, o que fez a diferença foi a superioridade dos adversários, mais não seja por terem estado num dia melhor.

 

Mas há um ângulo em que a exigência de condições faz sentido? Claro. Na resposta à exigência de medalhas. Os atletas falam em condições também como reflexo condicionado, como quem diz que até agora ninguém se preocupava mas depois já querem medalhas. O apoio ao atleta deve ser constante e faz sentido que alguém ignorado durante quatro anos responda dessa forma.

 

Há atletas que merecem ter mais condições. O Estado, juntamente com entidades privadas, devia delinear uma estratégia sólida que permitisse aumentar o recrutamento e condições de desenvolvimento de talento.

 

É aqui que a tal contabilidade dos diplomas olímpicos é tão importante. A quantidade de atletas que terminaram nas oito primeiras posições demonstra que a qualidade média da participação em Jogos Olímpicos está a crescer e que há alguma coisa que está a ser bem feita. Não conta para a glória efémera, aquela que é atribuída pelo português que assiste na televisão, mas pode e deve ser avaliada e elogiada por quem tem um papel direto no investimento.

 

Há, no entanto, outra coisa que nunca pode ser esquecida. Aumento de investimento não equivale a aumento de medalhas, da mesma forma que a quase ausência de investimento no passado não significou ausência de medalhas. No final, em eventos em que participam os melhores do mundo, é o talento que faz a diferença.

 

Carlos Lopes, Rosa Mota, Fernanda Ribeiro e Nelson Évora não se encontram a cada esquina. E Portugal tem de lutar também contra a ausência de nichos entre as modalidades olímpicas. Oito das dez medalhas do atletismo foram conquistadas em provas que hoje em dia são praticamente dominadas por africanos de origem.

 

E se outros países mais modestos têm outra tradição e conseguem focar-se em provas como halterofilismo e lutas amadoras, o melhor que Portugal está a conseguir é ameaçar a presença nas medalhas na canoagem. É um ponto de partida.

 

Desilusões olímpicas

 

Correu tudo bem então? Não, longe disso. Não houve nenhum fracasso contundente como em edições passadas (2008 deve estar no topo desta questão, sobretudo se avaliada a diferença entre expetativa provocada pelos próprios atletas e resultados), mas houve resultados que podiam ter sido melhores.

 

A valer medalhas? Nem por isso. A maratona feminina foi uma das principais visadas pelas críticas, sobretudo pela imagem deixada. Mas as expetativas não deviam ter sido elevadas: vencer a meia-maratona nos Europeus de Amesterdão não é cartão de visita nenhum: a distância é radicalmente diferente, Europeus não são Mundiais e a prova é sempre imprevisível.

 

Foi o que aconteceu antes dos Jogos Olímpicos, com o critério de escolha, e o facto de Sara Moreira ter desistido com uma fratura de stresse ao sétimo quilómetro que empolou a discussão. Isso e, uma vez mais, como em 2008, Vanessa Fernandes ter sido utilizada como veículo de crítica aos colegas. Na China, há oito anos, serviu de escudo ao próprio Comité Olímpico, sem argumentos para se defender dos maus resultados depois do objetivo de cinco medalhas. Agora foi como um megafone da crítica popular, menos incisiva mas sem ser capaz de defender as colegas.

 

De resto, é natural que Rui Bragança e a seleção nacional de ténis de mesa pudessem ter feito melhor. Ficaram ambos de fora dos oito primeiros e tinham condições para mais.

 

Populismos

 

Para memória futura, fica também o rol de argumentos populistas que, uma vez mais, foram recorrentes.

 

Não, a equipa de refugiados não venceu nenhuma medalha.

 

Sim, a equipa de olímpicos independentes ganhou duas medalhas. Foram dois kuwaitianos do tiro: um já tinha conquistado duas medalhas no passado e outro foi três vezes campeão mundial no passado. Se, digamos, o governo jamaicano tivesse criado uma lei que permitisse a dissolução das federações, o Comité Olímpico jamaicano era suspenso devido à ingerência governamental e não restava outra solução a Usain Bolt, Elaine Thompson e companhia que não participar pela equipa independente. Foi o que aconteceu aos kuwaitianos, dois naturais candidatos a medalhas. Fica mais percetível assim?

 

Sim, a Coreia do Norte conquistou sete medalhas. E sim, a Coreia do Norte tem uma enorme aposta no desporto e dá condições aos seus atletas. É um modo de afirmação patriótica através do desporto que já tivemos com Hitler, por exemplo, para não citar exemplos mais recentes durante a Guerra Fria. 

 

Sim, até o Kosovo ganhou uma medalha de ouro. Porquê? Escrevemos o perfil de Majlinda Kelmendi aqui.

 

Sim, as antigas repúblicas soviéticas socialistas continuam a ganhar medalhas. O Uzbequistão (sete no boxe, três nas lutas amadoras, duas no judo e uma no halterofilismo), o Cazaquistão (cinco no boxe e no halterofilismo, três nas lutas amadoras, duas no judo e uma na natação), a Geórgia (três nas lutas amadoras, duas no judo e duas no halterofilismo), o Azerbaijão (nove nas lutas amadoras, três no taekwondo, duas no judo, boxe e canoagem de velocidade), a Arménia (duas no halterofilismo e duas nas lutas amadoras), entre outras, foram fiéis à sua tradição. Nota-se um padrão, não nota?

 

É esse o conselho que temos para dar: comparar os resultados de Portugal com países com nome esquisito, que raramente ouvimos falar e dos quais sabemos muito pouco, pode nem sempre ser o mais inteligente. 

RPS

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