Majlinda Kelmendi. Valeu a pena sonhar
Judoca de 25 anos conquistou o primeiro título olímpico na história do Kosovo. O sonho concretizado serve de sinal para o jovem país: «Provei que podemos ser campeões olímpicos se quisermos, mesmo vindo de um país pequeno e pobre.»
O caminho para o sucesso
Majlinda Kelmendi nasceu a 9 de maio de 1991 e não teve uma infância tranquila. No meio da guerra dos Balcãs, a judoca kosovar cresceu com as marcas da destruição muito visíveis e com poucas oportunidades de ser alguém na vida.
O judo, que começou a praticar com oito anos, surgiu como a solução perfeita para encontrar um propósito: «Tenho a certeza que se não fosse o judo, não seria ninguém, especialmente no Kosovo.»
«Comecei a gostar porque fiz novos amigos, vi novas cidades e percebi que era uma forma de ser alguém. No início, os meus pais não acreditavam que conseguisse resistir, mas quando viram o quanto trabalhava e o quão boa era, ficaram muito felizes e orgulhosos», recorda, em entrevista ao Financial Times em maio de 2012.
O treinador Driton Kuka, com quem está desde os nove anos, tornou-se uma peça fundamental da sua evolução. «Desde o início que vi em Majlinda algo que outros não têm: é ambiciosa, muito corajosa e uma verdadeira lutadora», disse.
Batalha pelo reconhecimento
A maior luta na carreira de Majlinda Kelmendi não foi num pavilhão. O sonho de representar o Kosovo nos Jogos Olímpicos existiu desde sempre mas o Comité Olímpico Internacional não permitiu que o jovem país participasse em 2012, em Londres.
Na altura, Majlinda Kelmendi criticou o lado político da discussão: «Trabalhei muito para isto. Não quero ter alguém a dizer que não é possível fazê-lo em Londres. Não percebo por que é que tudo tem de ser político.»
A judoca garantiu também que, acontecesse o que acontecesse, iria representar o povo do Kosovo em Londres. E fê-lo, com as cores da Albânia, perdendo na segunda ronda na categoria de -52 quilos.
O dia em que tudo mudou
Terça-feira, 9 de dezembro de 2014. Majlinda Kelmendi era bicampeã mundial e campeã europeia na sua categoria quando o Comité Olímpico Internacional reconheceu o Kosovo e abriu a possibilidade de o país competir no Rio de Janeiro.
Desde o primeiro momento, Majlinda saltou para a ribalta. O primeiro-ministro Hashim Thaci reagiu no próprio dia a garantir que a bandeira do Kosovo seria mostrada na cerimónia de abertura e que seria a judoca a segurá-la.
Para a atleta, a sensação seria a mesma que antevia em 2010: «Serei a pessoa mais feliz do mundo se representar o Kosovo. Somos um novo estado, por isso seria a oportunidade ideal para mostrar ao mundo que no Kosovo há muitos jovens que conseguem fazer coisas boas.»
O contrário também era verdade. A partir desse momento, os jovens kosovares ganhavam o direito de sonhar em representar o país no palco desportivo mais importante. «Foi o melhor que podia ter acontecido ao Kosovo», declarou.
Glória ao segundo dia
O Kosovo chegou aos Jogos Olímpicos com oito atletas (cinco mulheres e três homens divididos por judo, atletismo, natação, ciclismo de estrada e tiro) e só precisou de dois dias para se tornar o centésimo país a vencer uma medalha de ouro.
Na final dos -52 quilos, Majlinda Kelmendi derrotou a italina Odette Giufrida e escreveu um capítulo histórico. «Há momentos que só vivemos uma vez. Hoje foi um deles. Quando o Thomas Bach [presidente do Comité Olímpico Internacional] me entregou a medalha, disse que tinha cumprido a minha parte do acordo. Ele sempre apoiou muito o desporto kosovar.»
«É um dia especial para mim, para a minha família, para o meu treinador, para o meu país, e, especialmente para as crianças do Kosovo. Provei que podemos ser campeões olímpicos se quisermos, mesmo vindo de um país pequeno e pobre», acrescentou.
Majlinda Kelmendi, uma jovem que não gostava muito de festas e que só tinha três ou quatro amigos porque só havia tempo para treinar, festejou por fim. E viu todos os sacrifícios serem recompensados à primeira grande oportunidade.
«O Kosovo não é apenas um país que sobreviveu a uma guerra. Nós temos uma nova geração incrível. Tive tantas ofertas para defender outros países, com muitos milhões envolvidos, e recusei só para poder sentir o que senti hoje. É inacreditável.»
RPS