Luka Modric não merecia esta injustiça
Croata foi mais do que o vencedor do prémio de melhor do mundo da FIFA. Foi – e continuará a ser – usado como uma arma de arremesso numa guerra de egos ao mesmo tempo que parece estar obrigado a receber o prémio em representação de todos aqueles que viveram na sombra de Messi e Ronaldo.
Vamos acreditar na pureza do futebol. Luka Modric venceu o prémio de melhor do mundo da FIFA porque é um jogador com uma qualidade irrefutável. Assumiu um papel basilar no Real Madrid tricampeão europeu e levou uma histórica Croácia à final do Mundial. O médio trata a bola com tal leveza e conforto que esta só não adormece porque se mantém excitada à espera de saber o que lhe vai acontecer desta vez, quais serão os caminhos imprevisíveis que o cérebro de Modric encontrou para desequilibrar um lance.
Mas não nos enganemos. Luka Modric não foi o melhor jogador do mundo. Da mesma forma que James Harden, Russell Westbrook ou muitos outros antes deles não foram os melhores jogadores do mundo quando venceram o MVP da fase regular na NBA. No futebol, tal como no basquetebol, a interpretação do prémio dá azo a que se vote da maneira que se quer.
Na última década, a hegemonia Messi-Ronaldo foi esmagadora. Argentino e português venceram cinco títulos cada um, numa era em que os dois são tão melhores do que qualquer outro que só mesmo os títulos coletivos têm servido para desequilibrar.
O mundo do futebol escolheu 2018 para dizer basta e a lista de motivos para tal ter acontecido pode ser infindável. Talvez parecesse uma injustiça que Ronaldo superasse Messi na lista de distinções, talvez a saída de Ronaldo de Madrid tenha levado a jogos de bastidores para afastar o prémio do português, talvez tenha mesmo havido uma vaga de fundo institucional para parar com a loucura e interromper a bicefalia do futebol mundial e o 5-5 tenha sido o ponto de partida ideal.
Os livros de história do futebol gostam da estatística. Ninguém vai poder ignorar a era em que Messi e Ronaldo venceram todos os prémios e que marcaram uma diferença enorme para quem os seguia enquanto batiam recordes individuais e coletivos. Mas, quer se queira quer não, as estatísticas vão promover o esquecimento de outros génios.
O nome de Modric será destacado, mesmo que não tenha mudado muito este ano em relação a anteriores. O croata interrompeu a hegemonia e entra na história por isso. O médio é um jogador do outro mundo e fez uma época sensacional mas não merecia estar associado a toda a especulação e aos motivos que podem ter levado à sua eleição.
Modric não fez mais esta temporada do que Iniesta fez no passado, sobretudo em 2010. Por isso mesmo, este prémio é também de Iniesta. E de Xavi. E de muitos outros que foram obrigados a partilhar os momentos áureos das suas carreiras enquanto Messi e Ronaldo se digladiavam, tanto em Espanha como na Europa do futebol.
Modric não merece que se fale tanto dos jogos de bastidores que Florentino Pérez poderá ter jogado. Modric não merece que se discuta tanto os verdadeiros motivos que levaram à sua eleição. Modric é um jogador genial, de topo, com uma qualidade singular e que rubricou uma temporada histórica a todos os níveis.
Modric merecia ser reconhecido unicamente por isso. Não deveria ser relegado para segundo, não deveria ser visto como uma bandeira de representação. Modric também é especial: saibamos apreciá-lo por isso.