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É Desporto

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28 de Março, 2018

Lou Gehrig. O Cavalo de Ferro que deu nome a uma doença

Rui Pedro Silva

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Fez 2130 jogos consecutivos pelos New York Yankees e pelo caminho venceu seis títulos. Série impressionante só foi interrompida quando os sintomas de uma esclerose lateral amiotrófica se tornaram demasiado fortes para que pudesse continuar. Despediu-se com um discurso comovente no Yankee Stadium a 4 de julho de 1939. 

 

Morte silenciosa

 

Como qualquer jogador de basebol na década de 30, Lou Gehrig era um exemplo para as crianças. Todas queriam ser como ele e viam nele um exemplo a seguir. Por isso, em 1939, quando um grupo de escuteiros o abordou numa estação de comboios e lhe desejou sorte, Lou Gehrig deu o primeiro sinal público do que estava para vir. «Aqui estão eles, a desejar-me sorte, sem fazer ideia que estou a morrer», desabafou com um jornalista.

 

Era difícil de acreditar que Gehrig pudesse ter um problema de saúde. Afinal de contas, era ele que estava há 14 anos sem falhar qualquer partida (2130 jogos consecutivos) na equipa nova-iorquina, ultrapassando todo o tipo de lesões. Para os norte-americanos, Lou era o Cavalo de Ferro. E fazia sentido. O problema foi quando começou a dar os primeiros sinais de quebra. Em meados da temporada de 1938, os números de Gehrig, que ainda hoje se mantém como um dos melhores jogadores de sempre dos Yankees em termos estatísticos, começaram a baixar drasticamente.

 

«Cansei-me a meio da época. Não consigo explicar porquê, mas não consegui voltar à forma habitual», disse na altura. Em abril de 1939, o jornalista James Kahn começava a adivinhar o que se passava: «Acho que há alguma coisa de errado com ele. Fisicamente mesmo, digo. Não sei bem o que é, mas fico satisfeito por ver que não tem nada a ver com as suas rotinas ou profissionalismo. Ele continua a fazer tudo bem, mas a potência e a força que tinha desapareceram. Ele consegue estabelecer contacto com a bola, mas ela não vai a lado nenhum».

 

O início do fim

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O sentimento de que algo estava mal começou a alastrar-se. O treinador, Joe McCarthy, resistia às pressões de tirar Gehrig da equipa inicial. Acabou por ser o próprio jogador a tomar essa decisão. A 2 de maio, em Detroit, Lou Gehrig informou McCarthy: «Hoje vou para o banco, Joe, decido eu». Era o fim de uma era. Depois de 2130 jogos, Gehrig ia quebrar a série. Após o anúncio nos altifalantes, os adeptos dos Detroit Tigers aplaudiram de pé, enquanto Gehrig se desfazia em lágrimas no banco.

 

Nunca mais voltaria a jogar. A aventura de Gehrig agora era outra. Saber o que estava errado. Naquele dia, na estação de comboio, já sabia. Sofria de esclerose lateral amiotrófica, doença que viria a ser conhecida com o seu nome, especialmente nos EUA e no Canadá, e que mais tarde também veio a provocar a morte do cantor Zeca Afonso.

 

A confirmação veio a 19 de junho, no dia do 36.º aniversário. Ultrapassado o choque, Gehrig sabia que precisava de anunciar aos adeptos dos Yankees a despedida, marcada para 4 de julho. Num estádio cheio e com a companhia de todos os antigos colegas, inclusive Babe Ruth, o melhor jogador de sempre. Após alguma indecisão, e com lágrimas nos olhos, Gehrig começou o discurso que ainda hoje é recordado como um dos momentos mais marcantes da história do desporto.

 

«Adeptos, sei que sabem do mau momento que atravesso desde as duas últimas semanas. Ainda assim, hoje considero-me o homem mais sortudo à face da Terra [...]. Pode estar a acontecer-me muita coisa má, mas sinto que tenho ainda imenso para viver.» Gehrig acabou por morrer dois anos depois, a 2 de junho de 1941.

 

Um nome imortalizado

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A carreira de Lou Gehrig foi uma das melhores de sempre de um jogador de basebol. O número 4 que envergava foi o primeiro a ser retirado por uma equipa da MLB e os números são avassaladores: além dos seis títulos e dos 2130 jogos consecutivos, Gehrig terminou a carreira com 2721 hits e 493 home runs.

 

A série de jogos consecutivos só foi batida por Cal Ripken, que chegou aos 2632 em 1995. Para chegar aos 2130, Gehrig superou vários obstáculos que, com qualquer outro jogador, poderiam ter sido suficientes para o deixar de fora, como quando ficou praticamente inconsciente após ser atingido por uma bola.

 

Por outro lado, o primeiro jogo da série também foi memorável. O dono da posição (primeira base) era Wally Pipp mas naquele dia acordou com dores de cabeça. «Foram as duas aspirinas mais caras na história», brincou mais tarde, recordando o dia em que perdeu o lugar.

 

Em 2009, Derek Jeter tornou-se o Yankee com mais hits da história, superando os 2721 de Gehrig. Ainda assim, a memória da antiga estrela continuará a ser mais importante que os seus recordes. Afinal de contas, era «o homem mais sortudo à face da Terra».