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É Desporto

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26 de Outubro, 2019

Lokomotive Leipzig. Cair aos pés de Van Basten

Rui Pedro Silva

Onze do Lokomotive na final contra o Ajax

Foi o último grande resultado europeu de uma equipa da República Democrática da Alemanha. Em 1986/1987, na Taças das Taças, a equipa de Hans-Ulrich Thomale conseguiu atingir a final depois de um percurso dramático, mas caiu em Atenas frente ao Ajax de Johann Cruijff, com Marco Van Basten, Frank Rijkaard e um jovem de 18 anos chamado Dennis Bergkamp.

O Lokomotive Leipzig era uma das presenças alemãs de leste mais regulares nas competições europeias. Entre 1967 e 1989, o clube da segunda cidade mais importante da RDA participou em provas da UEFA em 15 temporadas diferentes, ficando apenas atrás do Carl Zeiss Jena (16) e do Dínamo Dresden (20).

O facto de o clube nunca ter sido campeão potenciou uma presença massiva na Taça UEFA, com destaque para um apuramento para as meias-finais (1974 vs. Tottenham), mas foi na Taça dos Vencedores das Taças que a equipa atingiu o ponto mais alto da sua história.

As campanhas nesta competição foram aumentando de sucesso edição após edição. Em 1976/1977 caiu logo na primeira ronda frente aos escoceses do Hearts. Um ano depois, foi eliminado pelo Betis na segunda ronda. Em 1981/1982, na terceira participação, subiu mais um patamar e só caiu aos pés do Barcelona, conseguindo uma histórica vitória em Camp Nou (2-1).

Porém, foi apenas em 1986/1987 que o Lokomotive Leipzig, então orientado por Hans-Ulrich Thomale, ganhou a verdadeira dimensão europeia que sempre desejara. O percurso para chegar à Taça das Taças foi diabólico. Na Taça da RDA na época anterior, teve duas eliminatórias consecutivas decididas nos pormenores: nos quartos de final bateu o Carl Zeiss Jena nos penáltis depois das duas mãos terem terminado empatadas a zero; e nas meias-finais só superou o Dínamo Berlim graças aos golos fora (perdeu 4-2 na capital, ganhou 3-1 em casa). Depois de tanta emoção, a final foi um verdadeiro passeio, graças a uma goleada (5-1) imposta ao Union Berlim, com direito a um hat-trick de Hans Richter.

Menzo foi uma barreira intransponível na baliza do Ajax

Quando a nova época começou, o Lokomotive Leipzig sentia-se preparado para manter a bitola elevada perante a concorrência europeia numa prova que ia ter nomes como Ajax, Roma, Benfica, Estugarda e Bordéus como principais destaques.

O Glentoran da Irlanda do Norte foi o primeiro adversário e não teve argumentos para os rapazes de Leipzig: 1-1 no Reino Unido, 2-0 na RDA, com Richter a marcar o golo que decidiu definitivamente a eliminatória em cima do minuto 90.

A segunda ronda, também conhecida por oitavos de final, já não teve Roma – eliminada pelo Saragoça – e viu o Lokomotive resolver a eliminatória com o Rapid Viena no prolongamento. Depois de dois empates a um golo, Leitzke foi o herói, ao resolver o assunto em casa aos 118 minutos. Benfica (vs. Bordéus) e Estugarda (vs. Torpedo Moscovo) ficaram pelo caminho nesta ronda.

A facilidade dos quartos de final (2-0 vs. Sion em casa e nulo na Suíça) contrastou com o cenário de loucos reservado para a meia-final. Enquanto do outro lado do quadro o Ajax eliminou o Saragoça sem dificuldades, Lokomotive Leipzig e Bordéus lutaram até à última gota de suor pela presença na final de Atenas.

A vitória em França na primeira mão (Bredow 64’) chegou para aumentar a confiança mas o Girondins não perdeu tempo a empatar a eliminatória em Leipzig, com um golo de Zlatko Vujovic aos três minutos.

Durante as duas horas seguintes, o jogo não teve mais golos e foi necessário encontrar o finalista no desempate por penáltis. Aí, as equipas foram teimosas. Lindner e Touré marcaram na primeira série, mas Liebers e Vercruysse desperdiçaram logo a seguir. Depois, nos oito penáltis seguintes não houve ninguém a falhar. Ironicamente, acabou por ser Zoran Vujovic, irmão de Zlatko, a desperdiçar o pontapé que abriria caminho para a festa alemã oriental.

A final de Atenas, marcada para 13 de maio, tinha o Lokomotive como outsider. O Ajax já não era o mesmo dos anos 70… e ainda não seria o da nova geração dos anos 90, mas era comandado por Johann Cruijff e tinha um punhado de jogadores de enorme qualidade.

John Bosman, melhor marcador da competição, com oito golos, nem sequer fez parte da ficha de jogo, mas o Ajax metia medo de qualquer forma. Com Frank Rijkaard na defesa, Rob Witschge no meio-campo e Marco Van Basten no ataque, seria difícil para os alemães contrariarem o favoritismo holandês.

Longe ainda de atingir a imortalidade – um ano antes do golo à União Soviética -, Marco Van Basten marcou de cabeça, aos 20 minutos, o golo que decidiu a final. Por muito que tentassem, os alemães de leste foram incapazes de impedir a derrota e ainda assistiram à entrada de um jovem de 18 anos e três dias chamado… Dennis Bergkamp.

A era da RDA e do Lokomotive Leipzig estava à beira do precipício, mas para aquela geração de holandeses era apenas o início. Juntos, iriam escrever uma parte importante da história durante os anos seguintes.