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É Desporto

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20 de Março, 2018

Jordan vs. Ewing. Quando o intimidador virou intimidado

Rui Pedro Silva

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Era o maior confronto da final de 1982. Patrick Ewing tinha ordem para afetar todos os lançamentos de Michael Jordan e companhia e começou o jogo com quatro goaltendings. O melhor jogador da história não se deixou afetar e deu a vitória aos North Carolina Tar Heels sobre os Georgetown Hoyas a 15 segundos do fim (63-62). 

 

A aposta num jogo mental

 

John Thompson foi o primeiro treinador afro-americano a levar uma equipa à final do campeonato de basquetebol universitário. Ao comando dos Georgetown Hoyas, que tinham no rookie Patrick Ewing a sua grande figura, fez uma aposta arrojada: mexer com a cabeça dos jogadores adversários (North Carolina Tar Heels de Michael Jordan, Sam Perkins e James Worthy).

 

A ideia era simples: antes do começo da partida deu um recado a Patrick Ewing. O treinador queria que o poste se fizesse sentir no campo defensivo e tentasse bloquear todo e qualquer lançamento adversário, mesmo que isso implicasse fazer goaltending e oferecer dois pontos aos adversários.

 

Porquê? Nas palavras do técnico, «os jogadores não se lembram dos goaltendings, só se lembram de ver os seus lançamentos bloqueados». Patrick Ewing confirmou isso mesmo em declarações aos jornalistas no final do encontro: «Tudo o que estava a tentar fazer era obrigá-los a alterar os seus lançamentos».

 

A estratégia roçou o surreal. Patrick Ewing levou muito a sério o conselho do seu treinador e UNC (University of North Carolina) não conseguiu ver a bola a entrar no cesto uma única vez durante os primeiros oito minutos e oito segundos do jogo. Mas nem por isso ficou a zeros. Aliás, o resultado até estava bastante equilibrado: 12-8 para Georgetown. 

Todos os oito pontos de North Carolina eram goaltendings de Patrick Ewing: dois a James Worthy, um a Michael Jordan e outro a Sam Perkins. Afetados ou não, a verdade é que North Carolina somou lançamentos falhados (sete em onze) e perdas de bola (quatro) durante esse período.

 

De repente, Patrick Ewing foi substituído e os Tar Heels viram finalmente a primeira oportunidade para encestar uma bola: Matt Doherty concretizou um contra-ataque com sucesso.

 

Joga da corda

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A final foi equilibradíssima. Georgetown esteve quase sempre na frente, muito por culpa de Patrick Ewing, que ainda somou mais um goaltending assim que regressou do banco de suplentes, mas North Carolina nunca esteve muito distante.

 

Numa toada de parada e resposta em Nova Orleães, a música era mesmo de equilíbrio constante. Ao intervalo, Georgetown vencia 32-31 e Patrick Ewing «tinha» estado em 20 pontos: dez no cesto certo e dez nos cinco goaltendings cometidos.

 

North Carolina tinha o favoritismo. Tinha entrado na temporada como favorita e chegara à final depois de um ciclo de 15 triunfos consecutivos e apenas duas derrotas em 31 encontros. Além disso, tinha James Worthy (primeiro do draft da NBA em 1982), Michael Jordan e Sam Perkins (terceiro e quarto em 1984, respetivamente).

 

Do outro lado, Patrick Ewing viria a ser a primeira escolha do draft em 1985. O talento abundava por todos os lados mas a vantagem estava do lado dos Tar Heels, como se percebeu nos instantes finais. Com Georgetown a vencer 62-61, a equipa da Carolina do Norte encontrou em Michael Jordan um sinal do que viria a ser o melhor jogador de sempre: o base não sentiu a pressão e fez os dois pontos decisivos com um lançamento a 15 segundos do final.

 

Georgetown teve uma última posse de bola mas Fred Brown fez um turnover de forma incrível, com um passe lateral no perímetro para uma zona onde só estava mesmo James Worthy. Resultado final: 63-62.

 

Um título muito ansiado

 «Estou contente, sobretudo pelo treinador. Agora não vou ter de perder mais tempo a ler as vossas histórias sobre como ele vacila sempre nas finais», atirou Jimmy Black no final do encontro.

 

Dean Smith agradeceu as palavras. Afinal, estava há 21 anos a orientar a equipa e já tinha perdido os jogos decisivos em 1968, 1977 e 1981. Só que desta vez era diferente: «Foi a primeira vez que teria ficado aborrecido se tivesse perdido. Tínhamos mais talento, começámos a época no primeiro lugar do ranking e terminámos a época no primeiro lugar do ranking. Fomos o alvo a abater durante toda a temporada. Mas não tenho a certeza se fomos a melhor equipa hoje. Fomos, isso sim, a mais sortuda», disse.

 

Para a história, ficaram também os registos individuais de três futuras estrelas: James Worthy guiou o caminho com 28 pontos, quatro ressaltos, três desarmes de lançamento e um sentimento de alívio por estar de saída para a NBA: «Para um rookie, [Ewing] tem um talento fenomenal. Odiaria ter de defrontá-lo no próximo ano. E depois no outro a seguir».

 

De facto, Patrick Ewing foi o expoente dos Hoyas: 23 pontos, 11 ressaltos, quatro desarmes de lançamento e dois roubos de bola. O outro grande rookie do jogo, Michael Jordan, pode ter parecido mais discreto (16 pontos e nove ressaltos), mas apareceu nos momentos certos, marcando os últimos quatro pontos dos Tar Heels.

 

Os sinais estavam todos lá. Foi apenas uma questão de tempo até se ver o mesmo na NBA.