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É Desporto

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23 de Setembro, 2016

Jacoby Brissett. A sombra da sombra também brilhou

Rui Pedro Silva

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Suspensão de Tom Brady e lesão de Jimmy Garoppolo abriram espaço para que os New England Patriots tivessem um quarterback rookie a iniciar um jogo pela primeira vez desde 1993. Jacoby Brissett fez um jogo tranquilo e ajudou a equipa a derrotar os Houston Texans por 27-0. Esta é a sua história. 

 

A bola é para o mister

 

Os Patriots venciam por 3-0 depois de um field goal de Stephen Gostkowski e os Texans tinham acabado de fazer um fumble no seu meio-campo defensivo. Jacoby Brissett, 23 anos, mal tinha tido tempo para descansar no banco quando foi chamado para voltar a entrar.

 

Depois de uma penalização de cinco jardas no primeiro down, Brissett deixou a sua marca no jogo. Conseguiu iludir a oposição e correu 27 jardas para o primeiro touchdown do encontro. «Foi uma loucura. Foi incrível. É fantástico ver os jogadores todos a correrem na tua direção. Fiquei com dores de cabeça de tanto contacto entre capacetes. Mas valeu a pena, claramente.»

 

Naquele momento, Jacoby Brissett tinha cumprido um sonho de vida. Não só estava a ser o quarterback titular da melhor equipa do século XXI – o primeiro rookie na posição desde Drew Bledsoe em 1993 – como tinha acabado de justificar a aposta (forçada).

 

A corrida de 27 jardas foi a mais longa por parte de um quarterback dos Patriots desde 1976 (Tom Brady, por exemplo, nunca correu mais do que 22) e assim que voltou para o banco fez questão de oferecer a bola do touchdown ao treinador Bill Belichick.

 

O resto do jogo foi calmo para Brissett. Completou 11 de 19 passes, num total de 103 jardas, sem touchdowns nem interceções. O objetivo era conseguir a terceira vitória em três jornadas e foi para isso que contribuiu, sem riscos.

 

À imagem de Belichick

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O rookie poderá nunca ter a qualidade de Tom Brady mas o perfil obedece às características que o treinador tanto preza em jogadores, com o coletivo acima do individual e com uma conduta irrepreensível enquanto jogador.

 

Numa peça que fizeram sobre si nos Estados Unidos, escrevem mesmo que o mais próximo que ele já esteve de álcool foi quando teve um treinador no secundário chamado Jack Daniels. «Ele nunca bebeu um copo, nunca fumou um cigarro, nunca deve ter pensado sequer em fazer uma coisa dessas», diz o técnico com nome de whiskey.

 

A 91.ª escolha do draft deste ano tem um passado que só merece elogios por quem lidou com ele. Bom, exceto a mãe. Quando teve de decidir por uma universidade, foi contra os conselhos da mãe e optou pela Universidade da Florida, para jogar nos Gators.

 

«Não foi a minha escolha, fiquei muito desiludida com ele. Não gostei da forma como os Gators geriram o processo de recrutamento. Nunca pude conhecer o treinador. Nunca estive frente a frente com ele, acho isso um grande desrespeito. Estou magoada, queria que tivesse ido para Miami, porque a Universidade de Miami soube respeitar a sua mãe», disse Ellicia Brown, revelando que o filho lhe contou da decisão por mensagem escrita por ter medo da reação.

 

O problema das escolhas

 

Escolher uma universidade não foi a primeira vez que Jacoby teve problemas em fazer opções. Ainda no secundário, quando acumulava futebol americano com basquetebol, demorou mais tempo do que o previsto a optar por uma modalidade para jogar na faculdade.

 

Se essa escolha que fez deu frutos, o mesmo não se pode dizer de ter ido para os Gators. Depois de um ano no banco, atrás de Jeff Driskell (atualmente nos Cincinnati Bengals), decidiu trocar de equipa e seguir para a North Carolina State University.

 

A troca custou-lhe um ano: quando um jogador se transfere está obrigado a fazer um ano de pausa e não pode viajar com a equipa. Ao contrário do que se poderia pensar, foi precisamente durante esse ano que Jacoby começou a ganhar pontos entre os colegas de equipa.

 

A 26 de outubro de 2013, decidiu fazer uma viagem de carro, sozinho, entre Raleigh (Carolina do Norte) e Tallahassee (Florida) apenas para ver a equipa jogar com os Florida State Seminoles. «Foi algo que o fez destacar-se. Nunca ouvi nada parecido com isto», disse o coordenador ofensivo, Matt Canada.

 

Garrett Leatham, antigo quarterback da equipa, foi ainda mais longe: «Não conheço ninguém que conduzisse entre a Carolina do Norte até à Florida apenas para ir a um jogo onde a equipa dele ia ser dizimada em campo».

 

E foi. Ao intervalo, NC State já perdia por 0-42. Foi aí que, no balneário, Jacoby conquistou o grupo, fazendo um discurso sobre como era preciso dar um significado a todos os jogos e sentir orgulho por se estar a representar os colegas e a própria universidade.

 

Comportamento fora de campo

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Jacoby Brissett não obedece necessariamente à ideia que se tem de um atleta universitário. Fora de campo, sempre se preocupou em tomar boas decisões, responsáveis, e conseguir tirar o melhor delas. Foi por isso, por exemplo, que começou a investir na Apple.

 

«Achei que nunca iria investir em ações. Sempre tive atenção durante a faculdade e mesmo durante um período no secundário. Tenho dinheiro na Apple e às vezes fico sentado a olhar para o telemóvel, a ver a evolução, cêntimo a cêntimo, da cotação. E tem estado a subir muito rápido. Agora que lançaram um modelo novo, vai subir ainda mais», disse em 2014.

 

Outra característica forte de Jacoby Brissett na universidade era a forma como tratava os colegas. Em dias de jogo (sexta-feira), notabilizava-se por cozinhar brownies e outros biscoitos para oferecer a cada elemento da linha ofensiva. Por outras palavras, a todos aqueles que ajudavam a que não fosse esmagado pelos adversários a cada posse de bola.

 

Em cada oferta, incluía uma pequena nota pessoal, por vezes com uma piada para desanuviar a pressão e o ambiente em dias de maior pressão.

 

Ausência de agente

 

O terceiro quarterback dos New England Patriots foi o único jogador do draft deste ano a não contratar um agente para negociar o seu contrato com a equipa.

 

Se os colegas assinaram todos a 6 de maio, Brissett esperou até 16 de junho. Mantendo-se sempre otimista que o processo seria concluído (por lei, teria direito a um valor de 3,1 milhões de dólares mais um prémio de assinatura de 680 mil dólares), nunca sentiu pressão para acelerar a assinatura ou a delegar num agente para não ter tanta preocupação.

 

Resultado prático? Três meses depois, tem o contrato assinado, fez história pelos New England Patriots e estima-se que terá poupado cerca de 100 mil dólares por não ter recorrido a um agente. Talvez agora a mãe se sinta mais orgulhosa e menos magoada.

 

RPS