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É Desporto

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08 de Agosto, 2016

Ibtihaj Muhammad. Destinada a fazer história

Rui Pedro Silva

Ibtihaj Muhammad/AFP

Esgrimista tinha tudo para se tornar a primeira atleta norte-americana a competir de hijab nos Jogos Olímpicos em Londres mas uma lesão afastou-a da prova. Quatro anos depois, está de volta. Não vai ser porta-estandarte mas quer conquistar o ouro. 

 

O desporto e a religião

 

Chama-se Ibtihaj Muhammad, tem trinta anos e vai fazer história quando competir na prova de sabre individual esta tarde no Rio de Janeiro. A esgrimista, número dois norte-americana e oitava do ranking mundial, será a primeira atleta dos Estados Unidos a competir de hijab.

 

Nas últimas semanas, a imprensa norte-americana especulou sobre a possibilidade de vir a ser eleita para ser porta-estandarte na cerimónia de abertura, mas a escolha recaiu sobre Michael Phelps. Ainda assim, a atleta que já competiu contra Michelle Obama num evento em Times Square e que conversou com Barack Obama recentemente numa mesquita em Baltimore (o presidente pediu-lhe o ouro) terá os holofotes sobre si.

 

Acima de tudo, porque nunca deixou que a fé a impedisse de pôr em prática o talento inato que tem para o desporto. Esse é, aliás, o lema de vida da atleta que nasceu e cresceu em Nova Jérsia: «O desporto é algo que consegues fazer com um hijab. Não deves permitir que a tua fé comprometa o quão dotada atleticamente te tornaste. Tal como o género, a religião não te deve impedir de alcançares os teus objetivos.»

 

Encontrar uma modalidade

 

A mãe de Ibtihaj, Denise, sempre desejou que os filhos (quatro raparigas e um rapaz) pudessem praticar desporto. Sem dinheiro para escolas privadas, as opções no ensino público não eram tão alargadas. E, fosse qual fosse a escolha, era impensável que Ibtihaj competisse sem hijab.

 

A prioridade dos pais era encontrar uma modalidade em que pudesse competir completamente tapada, mas não foi fácil. Ibtihaj praticou natação, ténis, softebol, atletismo, voleibol e esgrima. Em qualquer um dos desportos, a mãe fazia-lhe equipamentos à medida, que permitiam que participasse mas sem pôr em causa a religião.

 

O voleibol e a esgrima foram resistindo até que a atleta sentiu que tinha de fazer uma escolha. No fundo, era o futuro que interessava, e Ibtihaj cedeu à ideia de que a esgrima seria uma opção melhor para conseguir uma bolsa na universidade.

 

Rumo ao Rio

Ibtihaj Muhammad com Michelle Obama/AP

Ibtihaj Muhammad formou-se em Estudos Culturais e Relações Internacionais na universidade de Duke, uma das mais conceituadas a nível académico e desportivo, e foi ganhando cada vez mais mediatismo no mundo da esgrima.

 

Em 2012, tinha tudo para ser uma das figuras em Londres, mas durante a preparação olímpica sofreu uma lesão num ligamento da mão que a forçou a uma paragem de seis meses.

 

A norte-americana não desistiu e foi à luta. No Rio de Janeiro, mantém-se «fiel ao propósito» e não admite ser vista de outra forma.

 

«Quando as pessoas imaginam uma esgrimista olímpica, possivelmente não pensam em alguém como eu. Felizmente, não sou como a maioria. Sempre acreditei que com trabalho árduo, dedicação e perseverança podia acompanhar os meus colegas dos EUA no caminho para a história olímpica.»

 

Discriminação não é fator

 

A esgrimista é afro-americana e muçulmana. Em tempos, pôde pensar nisso como uma justificação para um tratamento diferenciado por parte dos árbitros, especialmente num desporto em que é claramente uma minoria, mas agora não há margem para isso.

 

«Tenho alguma dificuldade em acreditar que alguém me trata diferente com base na minha crença. Por isso quando tive algumas dificuldades e fui mal tratada, sempre pensei que era por causa da raça. Acho que é o meu primeiro instinto», admite.

 

Mas Peter Westbrook, também ele um afro-americano e medalha de bronze em Los Angeles-1984 na mesma categoria, fez-lhe ver que não pode pensar nunca nesses moldes: «No minuto em que começares a pensar nisso, perdeste.»

 

No Rio de Janeiro, Ibtihaj só quer ganhar. «Tenho de me lembrar do meu objetivo», diz. E, já agora, cumprir o desejo de Obama. 

RPS