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É Desporto

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23 de Março, 2021

Gordie Howe. A incrível carreira do Mister Hockey

Rui Pedro Silva

Gordie Howe

A subjetividade é uma das maravilhas do desporto. É possível que «Gordie» tenha sido uma das primeiras palavras de milhares de crianças canadianas ao longo dos anos, mas em Portugal poucos serão aqueles que sabem quem é Gordie Howe.

A globalização ajudou a diminuir distâncias e hoje talvez seja muito mais provável que alguém em Portugal se tenha cruzado com este nome nos últimos anos, mesmo que nunca tenha visto um jogo de hóquei no gelo ou que não seja grande fã da modalidade.

Sempre que se fala em recordes na NHL, o nome de Gordie Howe aparece na conversa. Gordie Howe era Wayne Gretzky antes de haver Wayne Gretzky. E o currículo fala por ele. Numa era em que o período de atenção da pessoa comum é cada vez mais curto e os recrutadores de emprego preferem cada vez mais currículos curtos, de uma única página, em vez de testamentos, é difícil enfiar todas as grandes marcas da carreira de Howe em poucos parágrafos. Mas vamos a isso? Challenge accepted.

Gordie Howe estreou-se na NHL em 1946 e disputou o último jogo em 1980, com 52 anos. É o jogador mais velho de sempre a jogar na liga e não se limitou a fazer figura de corpo presente: disputou 80 jogos pelos Hartford Whalers com 15 golos e 26 assistências.

Gordie Howe representou os Detroit Red Wings nos primeiros 25 anos da carreira. Estreou-se com 18 anos em 1946, pouco mais de um ano depois do fim da II Guerra Mundial. E venceu a Stanley Cup em 1950, 1952, 1954 e 1955.

Gordie Howe foi o melhor marcador do campeonato em 1951, 1952, 1953, 1957 e 1963. Gordie Howe foi chamado para o jogo all-star entre 1948 e 1955, entre 1957 e 1965, entre 1967 e 1971 e, finalmente, em 1980, num total de 23 ocasiões. E foi membro da melhor equipa da liga em 12 temporadas.

Gordie Howe com Wayne Gretzky em 1972

Estatisticamente, a carreira de Gordie Howe é um paraíso. É o recordista de jogos da fase regular (1767), de jogos por uma só equipa (1687), é o jogador mais velho da história, com mais de quatro anos de vantagem para o segundo, e lidera o palmarés dos Red Wings, uma das equipas com mais tradição na história da NHL em pontos, golos e jogos. Quando disse adeus, com 52 anos e 11 dias, tinha 801 golos, 1049 assistências, um total de seis edições como melhor pontuador (golos mais assistências). E, como não podia deixar de ser, batizou uma hat-trick muito particular: golo, assistência e luta.

A carreira de Gordie Howe, que chegou a partilhar balneário com os filhos Mark e Marty na última temporada, em 1980, foi um mar de rosas, mas a infância, como a de tantas outras figuras na história do desporto, envolveu sofrimento e um contexto familiar complexo.

Nascido em março de 1928, era um de nove irmãos, e «viu» a família mudar-se logo no primeiro mês de vida. A Grande Depressão não teve um impacto imediato mas, anos mais tarde, foi obrigado a deixar a escola para ir trabalhar na construção civil antes de, aos 16 anos, dedicar-se exclusivamente ao sonho de ser um dos melhores jogadores de hóquei da história.

Gordie era um artista, um malabarista. Poderia ter sido um Harlem Globetrotter da patinagem, tal era a sua perícia com o stick, o disco e a capacidade para executar manobras visionárias que estavam ao alcance de muito poucos, sobretudo naquela altura. E como nunca é demais reiterar a importância de Howe na NHL, vamos a mais um apontamento estatístico: a NHL tinha 29 edições disputadas (apenas quatro da era Original Six, com apenas Montreal Canadiens, Toronto Maple Leafs, Boston Bruins, Detroit Red Wings, New York Rangers e Chicago Blackhawks) quando Howe se estreou. E disse adeus definitivamente na 63.ª edição, já com 21 equipas a disputar a Stanley Cup.

A passagem de testemunho para Wayne Gretzky foi natural mas Gordie Howe continuou a ser considerado como uma das melhores obras-primas da modalidade. Muitos dos seus recordes começaram a ser batidos, mas a ideia de «Gordie Howe» nunca chegou a ser derrubada. É uma lenda da modalidade, inspirou várias gerações de atletas e, quando morreu, em 2016, a liga homenageou-o em uníssono num dos funerais mais concorridos na história do Canadá.