Gift Ngoepe. O primeiro da MLB «made in Africa»
Quando era pequeno vivia com a mãe num estádio de basebol nos arredores de Joanesburgo. O primeiro contrato com os Pirates chegou em 2008 e teve de esperar quase dez anos pela estreia na elite: «Quando me chamarem para entrar no jogo, acho que provavelmente vou desfazer-me em lágrimas.»
Ainda há espaço para pioneiros
Terça-feira, 15 de abril de 1947. Foi há mais de 70 anos que a história da MLB mudou para sempre. Na liga de Babe Ruth, Lou Gehrig e Ted Williams, Jackie Robinson derrubou a barreira racial e tornou-se o primeiro afro-americano a jogar na liga profissional.
Não foi fácil. Não poderia ter sido. O país estava muito dividido, o conflito era uma constante, sobretudo nos estados do sul, mas Jackie Robinson, com o seu eterno número 42, contou com a aposta do proprietário dos Brooklyn Dodgers para fazer história.
As sete décadas que se seguiram transformaram radicalmente a ideia que se tinha do basebol. O desporto perdeu estatuto nos EUA – a NFL e a NBA mostraram ser mais aglutinadores – mas ganhou fãs por todo o mundo. Os mundos hispânico e asiático transformaram-se nos parceiros ideais e a percentagem de estrangeiros tornou-se cada vez mais significativa.
Havia sul-americanos, havia asiáticos, havia europeus, havia caribenhos. Só não havia africanos… até esta semana. Na madrugada de 26 para 27 de abril em Portugal, num jogo entre os Pittsburgh Pirates e os Chicago Cubs, Gift Ngoepe transformou-se no primeiro jogador nascido em África a atuar num jogo profissional da MLB.
Da África do Sul para a Pensilvânia
Gift Ngoepe nasceu em Randburg, na província sul-africana de Gauteng, a 18 de janeiro de 1990. A mãe trabalhava na equipa de basebol local e o pequeno Gift percebeu desde cedo que tinha uma ligação especial com o desporto. Mas será que a MLB também teria uma ligação especial com ele?
Em 2008, com apenas 18 anos, os Pittsburgh Pirates decidiram arriscar, depois de o terem visto em ação num estágio da academia da MLB em Itália. Ao contrário de outros desportos, o caminho entre o primeiro contrato profissional e a estreia entre a elite nem sempre é fácil. As grandes organizações têm várias equipas satélite e o filtro vai-se fazendo naturalmente.
No caso de Ngoepe, foi preciso esperar praticamente dez anos. Passo a passo, foi subindo patamares e ameaçando alcançar mais do que os outros cinco sul-africanos que também tinham assinado um contrato profissional.
Um dia para mais tarde recordar
Quarta-feira, 26 de abril de 2017. Os Pittsburgh Pirates decidiram que estava na hora e chamaram Gift Ngoepe para a equipa. «Ainda não consegui assimilar. Quando me chamarem para entrar no jogo, acho que provavelmente vou desfazer-me em lágrimas», disse o sul-africano antes do jogo.
O momento não foi fácil. O período da vida em que viveu com a mãe num canto do estádio dos Randburg Mets parecia tão longínquo e próximo ao mesmo tempo. «É tudo incrível. Grande balneário, grande estádio… tudo é de tirar a respiração», continuou.
Gift Ngoepe reconheceu que a estreia seria muito importante na África do Sul e confessou que tinha andado a receber telefonemas e mensagens da família e amigos durante o dia. «Significa que não interessa de onde venhas, não interessa onde estás ou quem és, continuas a poder alcançar o teu objetivo», disse.
A mãe não viveu o tempo suficiente para ver a estreia do filho. Quatro anos depois de morrer de pneumonia, o filho entrou em campo, encarou Jon Lester – a grande estrela dos Chicago Cubs e com três títulos já conquistados – e coroou o momento com um hit, alcançando a primeira base.
Gift Ngoepe terminou o jogo com um hit, uma base por bolas e uma eliminação por strikes. A partir de agora, nada mais será o mesmo.
RPS