Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

É Desporto

É Desporto

29 de Agosto, 2016

Figuras Olímpicas XII - Aly Raisman

Rui Pedro Silva

Aly Raisman

«Quando tinha oito anos estava obcecada com as Magnificent Seven de 1996. Ia para casa e via vídeos delas repetidamente. Queria ser exatamente igual a elas.» Em 2016, a ginasta de Massachusetts já entrou para a história olímpica do país e até admite estar em Tóquio-2020. 

 

História à sua maneira

 

A ginástica nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro foi dominada por Simone Biles. A jovem somou quatro medalhas de ouro e uma de bronze e, naturalmente, teve os holofotes sobre si. Na sua sombra, com 22 anos, Aly Raisman também fez história à sua maneira.

 

A ginasta de Needham, no Massachusetts, repetiu a presença nos Jogos Olímpicos ­– tal como Gabby Douglas – e chegou às seis medalhas. Em Londres conquistou o ouro na prova por equipas e no solo, enquanto na trave foi medalha de bronze. Quatro anos depois, no Rio de Janeiro, foi bicampeã olímpica na prova por equipas (mais velha de sempre a ser medalha de ouro) e foi segunda no solo e no concurso completo… atrás de Simone Biles.

 

As seis medalhas fazem dela a segunda americana mais medalhada de sempre na ginástica, atrás apenas de Shannon Miller, que entre Barcelona e Atlanta, conquistou duas medalhas de ouro, duas de prata e três de bronze.

 

É por estar tão perto de fazer história que Aly Raisman, que já surgiu no Brasil um pouco contra as probabilidades devido à idade, admite voltar para Tóquio, com 26 anos.

 

«Houve alguém que me disse que me faltava apenas uma medalha para igualar a Shannon Miller. É óbvio que é algo mais fácil de dizer do que conseguir mas deixou-me a pensar. É claro que preciso de algum descanso e devo tirar um ano ou assim mas depois verei o que se poderá fazer», disse.

 

«Sinto-me bastante bem com 22 anos. Vamos ver o que o futuro me reserva», acrescenta. Já Shannon Miller não parece incomodada com a ameaça, a avaliar pela mensagem que lhe deixou nas redes sociais: «Nunca páras de me espantar. De avó e capitã da equipa à história de redenção de uma vida.»

 

Ginástica, o início

Aly Raisman

Aly Raisman começou a praticar a modalidade com dois anos, na mesma época em que os Estados Unidos receberam os Jogos Olímpicos de Atlanta. Quis o destino que fosse a equipa de ginástica desse ano, com Shannon Miller, a influenciar a criança de forma inevitável.

 

«Quando tinha oito anos estava obcecada com as Magnificent Seven de 1996. Ia para casa e via vídeos delas repetidamente. Queria ser exatamente igual a elas», confessa.

 

Judia, com mãe que tinha sido ginasta e pai jogador de hóquei, Aly fez dessa obsessão a forma de melhorar a cada ano que passava. A mentalidade é explicada pela própria: «Preciso de muito mais repetições para me sentir confortável. Outras podem precisar de cem, eu preciso de mil. Tenho de acreditar mais em mim mesma: no final é mesmo das coisas mais importantes. Podes trabalhar um milhão de horas mas se não acreditares em ti, não vais conseguir.»

 

A mãe Lynn confirma esta forma de vida. «Quando quer algo, esforça-se muito mais.» E Marta Karólyi, cérebro por trás da organização da ginástica nos Estados Unidos, admitiu em 2012, ainda antes dos Jogos Olímpicos, que esse era um dos atributos mais aliciantes de Raisman: «Fiquei muito impressionada pela forma como abordou a competição [US Classic em Chicago]. Não se percebe sequer se ela está a sentir a pressão ou não. É de raparigas assim que precisamos nos Jogos Olímpicos. E isso que as faz ter sucesso.»

 

Estreia em Londres

 

A estreia olímpica foi o culminar de um sonho. Para trás, estavam os Mundiais de 2011 em que foi capitã e cimentou o estatuto de líder da equipa. «Sou a mais velha dos meus irmãos [tem três], por isso é algo natural. Não penso necessariamente nisto como líder da equipa, só estou aqui para ajudar as outras.»

 

Londres teve tanto de doce como de amargo. As duas medalhas de ouro [por equipas e solo] e a medalha de bronze [na trave após protesto que aumentou a nota] não serviram totalmente para apagar a desilusão de ter sido quarta, após desempate, no concurso completo.

 

«Odeio o número quatro, apetece-me cortá-lo ao meio. Querem ouvir a quantidade de vezes que fui quarta? Olhem que ficamos aqui a noite inteira», avisa a ginasta numa antevisão da NBC para os Jogos do Rio de Janeiro. Mas, de todas as vezes, nenhuma custou tanto como em Londres.

 

Com os mesmos pontos da russa Aliya Mustafina, os juízes fizeram o desempate através da soma das três notas mais altas entre os quatro aparelhos. Aí, Raisman ficou de fora das medalhas.

 

Pausa e regresso

Aly Raisman

A ginástica é um desporto com muito pouca longevidade olímpica. Oksana Chusovitina pode ter participado na sétima edição mas é um caso único. Na verdade, repetir a presença já costuma ser muito invulgar, especialmente numa seleção tão competitiva como a norte-americana.

 

Aly Raisman começou por pensar que Londres tinha sido “a” oportunidade e parou após os Jogos Olímpicos. Mas não resistiu muito tempo. «Sempre achei que ia voltar mas senti que tinha de fazer uma pausa. Demorei um ano a sentir que estava pronta. Foi a única vez em que pude descansar na minha carreira», disse.

 

O clique fez-se ao assistir aos Nacionais de 2013: «Voltar a ver aquela atmosfera, as atletas todas e os treinadores… foi muito bom voltar.» Para trás ficava a vida social, que a levou, por exemplo, a participar no programa «Dancing with the Stars».

 

Os pais apoiaram Aly, como sempre [têm um longo historial de sofrimento nas bancadas], mas Rick recorda que houve dificuldades no início: «Não foi fácil perceber que a segunda vez é mais difícil. Está mais velha, o corpo está diferente.»

 

Aly Raisman admite dois tipos de dificuldades. Por um lado, lembra que muitos olharam para ela como se fosse doida. «Não queria ter ficado a ver no sofá e a pensar o que aconteceria se tivesse tentado», destaca. Por outro, sentiu a obrigação de proteger os pais.

 

«Tem sido tão stressante para mim como para eles. Eles estão lá todos os dias quando chego a casa e estou exausta, e não me sinto bem. Tento esconder se algo me incomoda, tento não lhes dizer. Porque é a minha mãe e o meu pai, são muito protetores, querem sempre o melhor para mim e ficam muito nervosos», admitia durante a preparação para o Rio de Janeiro.

 

«Não creio que quisessem necessariamente que eu voltasse. Diziam-me que tinha estado tão bem e que tinha sido tão difícil. E que provavelmente seria ainda mais difícil na segunda vez», acrescenta.

 

Ataque ao Rio de Janeiro

Aly Raisman

Raisman aprendeu com eles e chegou mesmo ao Brasil, com 22 anos. Novamente a líder da equipa, ganhou uma alcunha especial. «Ela é como a nossa avozinha, sempre a dormir», comentou Simone Biles.

 

A defesa de Raisman não se fez esperar: «Ela diz que eu estou sempre a dormir e olha para mim como se fosse doida mas o que não é natural é não estar cansada depois de se trabalhar tanto.»

 

No Rio de Janeiro, Raisman não conseguiu defender o título no solo e também foi segunda classificada no concurso completo. Em ambas, o título foi para Simone Biles. Fracasso? Longe disso. «Ninguém entra a pensar que consegue derrotar a Simone tal como também não se pensa que é mais rápido do que o Bolt.»

 

As três medalhas no Rio de Janeiro foram a confirmação de que valeu a pena arriscar e voltar a passar por todo o trabalho de preparação. Nos últimos dias, num jogo dos Boston Red Sox (basebol), deixou um conselho: «Nem sempre vai ser divertido, nem sempre vai ser fácil. Mas se se gostar mesmo, se se trabalhar arduamente, se se fizer sacrifícios e se se for muito disciplinada, então poderá mesmo alcançar-se tudo o que se quiser.»

 

A prata no concurso completo, quatro anos depois da desilusão do desempate, também mereceu um comentário especial: «Mostra que nunca deves deixar que alguém te diga que não consegues. Nunca deves desistir só porque falhaste em alguma coisa.»

 

RPS