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É Desporto

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16 de Fevereiro, 2018

Família Dukurs. A maldição do quarto lugar no skeleton

Rui Pedro Silva

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PyeongChang-2018 marcou a terceira edição consecutiva dos Jogos Olímpicos de Inverno em que um dos irmãos da família Dukurs da Letónia terminou a prova de skeleton na posição à porta do pódio. Recentemente julgou-se que podia haver uma recompensa a caminho mas tudo não passou do papel. 

 

Medalha de lat...via

 

Dizem que o quarto lugar é a posição mais ingrata numa prova de Jogos Olímpicos, seja ela qual for. Sim, o segundo pode ser o primeiro dos últimos mas atribui uma medalha. Sim, o segundo pode ser visto como o líder dos derrotados, como lhe chama Jerry Seinfeld num espetáculo, mas traz sempre uma sensação de maior conforto e recompensa do que o quarto lugar.

 

Ser quarto é ser votado ao esquecimento. Ser quarto é espantar um país no voleibol de praia, como Miguel Maia e João Brenha fizeram em Atlanta-1996, apenas para desaparecer depois de todos os documentos que fazem referência à edição e mostram apenas os três primeiros. E se ser quarto uma vez já é dose, sê-lo duas vezes, como a dupla portuguesa também foi, torna tudo mais ingrato.

 

É esta a história da família Dukurs, que atingiu o pior ponto da evolução em PyeongChang-2018. Numa família totalmente dedicada ao skeleton – o pai Dainis é o treinador da seleção – os irmãos Tomass (nascido em 1981) e Martins (1984) surgem como os expoentes máximos.

 

A estreia em Jogos Olímpicos chegou pela mão do mais velho, em 2002, com um modesto 21.º lugar em Salt Lake City, e foi seguida pela primeira participação de Martins, quatro anos depois, com um sétimo lugar. Só a partir de 2010 os dois começaram a competir juntos no mais importante evento mundial.

 

Regularidade agridoce

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Lembram-se daquele pequeno conflito sobre o que será pior: ser o primeiro dos últimos na segunda posição ou o primeiro dos que não ganham medalhas no quarto lugar? Pois, os irmãos Tomass e Martins podem escrever toda uma dissertação sobre esse assunto. Afinal, ninguém melhor do que eles sabe o que isso é.

 

Comecemos por Vancouver, em 2010. Martins fez uma prova muito melhor do que o irmão e terminou na segunda posição, a meros sete centésimos de segundo do campeão olímpico, o canadiano Joe Montgomery que competia em casa. O pior? Tinha entrado para a quarta e última manga com uma vantagem de 18 centésimos.

 

Já Tomass não fez mais do que cheirar o pódio, no quarto lugar, a 38 centésimos do russo Aleksandr Tretyakov. Pode ter parecido uma tretya, terminar foram dos três primeiros lugares mas, pelo menos, não sofreu uma grande desilusão no final, uma vez que já tinha entrado para a despedida nessa posição.

 

Déjá-vu em Sochi-2014

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Quatro anos depois, mais do mesmo. Martins Dukurs voltou a ser segundo… atrás de um adversário a correr em casa, Aleksandr Tretyakov. Por outro lado, desta vez não teve nenhum amargo de boca na ponta final, uma vez que só por uma vez conseguiu ser mais rápido do que o rival, na terceira manga, e por apenas dois centésimos de segundo.

 

Tomass também repetiu a posição, à porta do pódio, a 32 centésimos do norte-americano Matthew Antoine e depois de ter perdido regularmente tempo em todas as quatro corridas: 14, 11, seis e um centésimos, respetivamente. De qualquer forma, esta regularidade não apagava o dissabor de, uma vez mais, ter ficado tão perto de receber uma medalha.

 

A diferença de PyeongChang-2018

 

«Querem as boas ou as más notícias?», podia ter perguntado uma vidente aos irmãos Dukurs antes da prova da Coreia do Sul. Há sempre formas de ver o copo meio-cheio e neste caso, para Tomass, podia dizer-se que pelo menos não ia terminar na quarta posição. A má notícia? A ingratidão do lugar ia ser sentida pelo irmão Martins. E desta vez nem haveria medalha para a família, já que o mais velho ficaria imediatamente a seguir, no quinto posto.

 

Houve coisas que não mudaram, ainda assim. O campeão olímpico voltou a ser, pela terceira edição consecutiva, um atleta da casa. E que atleta! Sung-bin Yun venceu as quatro mangas da competição e estabeleceu recordes da pista em três delas. No final, a vantagem de 1,63 segundos para a medalha de prata não deixou margem de discussão. 

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Quanto aos irmãos Dukurs, a maldição bateu fortemente à porta. À entrada para a última corrida, parecia que ia ser uma edição igual às anteriores. Martins estava na segunda posição, com quatro centésimos de vantagem sobre Dominic Parsons e sete sobre Nikita Tregubov. Já Tomass era quinto a 56 centésimos do irmão e dificilmente poderia lutar pelas medalhas.

 

Dominic Parsons reconheceu a sorte que teve ao ganhar a medalha de bronze, aproveitando o deslize de Martins Dukurs, o atleta que já venceu cinco vezes o Mundial e sete vezes a Taça do Mundo: «Não estava à espera de conseguir subir. Ele seria o último atleta que eu poderia esperar que cometesse erros destes. Tem sido tão dominador nos últimos anos».

 

O resultado final comprovou a falta de hipótese do mais velho e o contágio do azar ao mais novo, que recebeu o testemunho do quarto lugar. Feitas as contas, Martins perdeu duas posições na última manga e terminou a apenas 11 centésimos da medalha de bronze e 13 da de prata.

 

Drama imparável

 

A família Dukurs vai somando amargos de boca em edições dos Jogos Olímpicos, apesar das duas medalhas conquistadas, mas passou três meses a sonhar com uma recompensa retroativa. Tudo porque em novembro de 2017 o Comité Olímpico Internacional decidiu retirar a medalha de ouro de Sochi-2014 a Tretyakov na sequência de uma análise à urina realizada em 2016.

 

O problema é que o Comité Olímpico Internacional deu a esperança com uma mão para depois dar uma bofetada com a outra. O russo pediu recurso e a 1 de fevereiro, nas vésperas dos Jogos de PyeongChang, o Comité Olímpico Internacional decidiu restaurar o título olímpico. Para Dukurs, foi apenas mais um capítulo de desilusão. Haverá mais em Pequim-2022?