David Wilkie. Furar a hegemonia esmagadora dos Estados Unidos
Especial Jogos Olímpicos (Montreal-1976)
Quadro de vitórias nas provas de natação dos Jogos Olímpicos de Montreal, em 1976, traça dois domínios esmagadores. Na vertente feminina, a República Democrática da Alemanha conquistou todas as medalhas de ouro menos duas. Na masculina, o domínio dos Estados Unidos foi ainda maior e só deixou escapar um título. O culpado foi o britânico David Wilkie.
Olhar para os resultados das provas masculinas de natação em 1976 é como estar num livro de Onde Está o Wally?, modo principiante. A competição tinha 13 corridas e os Estados Unidos subiram ao lugar mais alto do pódio em 12. A contrastar com esta hegemonia impressionante, surge apenas o resultado dos 200 metros costas, prova em que os norte-americanos John Hencken e Rick Colella foram ao pódio mas acabaram obrigados a ouvir o «God Save the Queen».
O objetivo dos Estados Unidos era claro, não foi apenas uma coincidência. Dominavam a natação masculina e queriam fazer o pleno. E estiveram muito perto de o conseguir, não fosse o feito especial de David Wilkie que, ainda por cima, conseguiu ser o primeiro britânico a ganhar um ouro na natação desde 1908.
Nascido e crescido no Sri Lanka, mudou-se para a Escócia com onze anos e começou a dar as primeiras braçadas. Exatamente onze anos depois, em Montreal, Wilkie já tinha resultados para impressionar os americanos. Afinal de contas, sagrara-se campeão do mundo por três vezes: uma em Belgrado-1973 e duas em Cali-1975.
Os 200 metros costas eram a sua maior especialidade. E os norte-americanos conheciam-no bem. Era nos Estados Unidos, na Universidade de Miami, que Wilkie progredia semana após semana, depois do título de 1973 em que, com um recorde mundial, surpreendeu Hencken pela primeira vez.
A relação entre os dois era a de uma rivalidade palpitante. Os dois eram especialistas em costas e o primeiro duelo estava marcado para os 100 metros: Hencken registou uma nova melhor marca mundial e bateu Wilkie por 32 centésimos.
A vingança serviu-se nos 200. Hencken até estava na liderança na metade da prova mas não teve qualquer argumento para impedir que Wilkie fizesse história, com novo recorde mundial, um que duraria oito anos (algo raro nesta época), e mais de dois segundos de vantagem.
Wilkie foi mesmo a espinha na guelra dos norte-americanos. Excluindo as provas de estafetas, nas quais os Estados Unidos só podiam ocupar um lugar no pódio, a comitiva garantiu 25 das 33 medalhas possíveis. E se Wilkie foi o único não-americano a ganhar uma prova, também foi o único a garantir uma medalha de prata. As sete medalhas restantes foram todas de bronze e acabaram distribuídas entre alemães (dos dois lados do muro), soviéticos e australianos.
Perante este exercício de supremacia autoritária, o feito da República Democrática da Alemanha parece tímido. As nadadoras do lado oriental só não ganharam os… 200 metros costas (Marina Koshevaya da União Soviética) e a estafeta dos 4x100 metros livres (Estados Unidos). Feitas as contas, a comitiva feminina garantiu onze medalhas de ouro, seis de prata e uma de bronze.
No conjunto das provas de natação, foram atribuídas 78 medalhas e EUA (34) e RDA (19) açambarcaram 67,9% dos metais preciosos. Já não se fazem domínios assim.