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É Desporto

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25 de Outubro, 2016

Como festeja quem nunca ganhou?

Rui Pedro Silva

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Final do basebol vai fazer história. De um lado, os Chicago Cubs não são campeões desde 1908. Do outro, os Cleveland Indians estão à espera desde 1948. Der por onde der, há gerações inteiras de famílias que só agora vão poder celebrar. Mas como é quando assim acontece? Como se faz? O que se sente? Como é que festeja quem nunca ganhou? 

 

A sôfrega espera

 

Qualquer sportinguista nascido na década de 1980 consegue identificar-se com esta sensação. A de crescer a ouvir histórias de como o clube já foi campeão mas, época após época, não conseguir repetir esse feito. De ouvir os amigos, os amigos dos pais, os desconhecidos que perguntam “então e tu, de que clube é que és?” antes de soltar, jocosamente, o comentário de que desde que nasceu nunca viu a equipa ser campeão.

 

Ano após ano, são os outros que fazem a festa. Ano após ano, a desilusão toma lugar e só a esperança do famoso “para o ano é que é” ajuda. A esperança e os relatos dos mais velhos, sejam pais ou avós. Aqueles que transmitiram a paixão por um clube e que lhes conseguiram incutir essa dedicação, fazendo um bypass à necessidade de alimentação via títulos.

 

Mas o Sporting, tal como FC Porto ou Benfica, nunca estiveram mais do que uma geração sem ganhar. Quando se atravessa o Atlântico e se fala de basebol, o ciclo vicioso é mais longo, as oportunidades são menores e o último título, quando existe, pode não acontecer há duas, três, quatro gerações.

 

É esse o caso que se vive em Chicago. Em 2005, quando os White Sox foram campeões no basebol, os adeptos estavam há 88 anos sem festejar. Agora, em 2016, os Cubs têm uma maldição de 108 anos. 108 anos. Desde 1908.

 

Gerações à espera

 

Um homem de 30 anos adepto dos Cubs nunca viu a equipa vencer a World Series. Os seus pais, provavelmente nascidos na década de 50, também não. E os avós, na década de 20, também não. Tudo não passa de um sonho. De relatos contados por outros, por almanaques e publicações que lembram uma época em que Babe Ruth ainda não era ninguém.

 

A diferença para Cleveland são 40 anos. Um adepto de 80 anos tem toda a capacidade de se lembrar do último título, mas isso não invalida que as duas ou três gerações seguintes não tenham qualquer ligação direta ao evento.

 

Vivem no sonho. No desejo. Na promessa do que um dia farão se a equipa for finalmente campeã. Quando os Red Sox foram campeões em 2004, 86 anos depois, verificou-se uma migração em massa de adeptos aos cemitérios. Todos quiseram partilhar o momento com os pais e os avós que não viveram tempo suficiente para voltar a festejar.

 

Em Wrigley Field, estádio dos Cubs, são vários os cartazes que dizem “só um título antes de morrer” envergados por idosos que sabem que o tempo e as oportunidades se estão a esgotar.

 

O mundo do desporto não é o que é por causa das vitórias. Nem dos títulos. O mundo do desporto é um mundo de emoções. Pelas lágrimas de alegria e de tristeza que consegue provocar em momentos memoráveis. Pela união que provoca entre familiares, amigos e desconhecidos.

 

Antecipação

 

Na próxima semana, vai haver festa. Ganhem os Cubs ou os Indians, a percentagem esmagadora dos adeptos estará a celebrar pela primeira vez. Será único. Será a primeira vez. Depois de anos e anos a sonhar com o dia em que o título chegaria, ele estará ali à frente.

 

Aí, nesse momento, não haverá preparação nem antecipação que os salve. Será espontâneo. Será uma alegria única difícil de explicar e que nunca mais será replicada, por mais títulos que cheguem ou por muito que surja uma nova seca de celebrações.

 

O mundo do desporto é assim. São estes os momentos aos quais nos devemos agarrar e emocionar.