Chad Bettis. Eliminar o cancro por strikes
Jogador dos Colorado Rockies superou um cancro testicular, derrotou uma breve recaída e voltou a disputar um jogo na MLB esta madrugada frente aos Atlanta Braves. A fantástica exibição foi a cereja no topo do bolo.
De repente, tudo mudou
A paciência é uma das maiores virtudes do basebol. Chegar à liga profissional obriga a um longo percurso e está longe de ser como no basquetebol, em que adolescentes fazem um ano na universidade e se declaram aptos para a NBA, começando a angariar minutos logo na primeira temporada.
No basebol, é preciso evoluir. Há casos de entradas diretas, mas o habitual é andar anos a queimar etapas em equipas satélite até merecerem a aposta. No caso de Chad Bettis, nascido a 26 de abril de 1989 no Texas, houve ingredientes adicionais.
Escolhido pela primeira vez em 2007, pelos Houston Astros, o jovem não chegou a assinar e manteve-se na universidade de Texas Tech. Três anos depois, nova oportunidade, ao ser selecionado pelos Colorado Rockies na segunda ronda (76.ª escolha).
Bettis é um lançador destro. Será, possivelmente, a posição com menos oportunidades no basebol, mas nunca perdeu a paciência. Esperou, melhorou, mostrou sinais de poder dar um bom contributo à equipa do Colorado e teve direito à estreia a 1 de agosto de 2013.
O ritmo do progresso manteve-se de época para época e em 2016 fez a melhor temporada da carreira, começando em 32 jogos, atingindo o melhor momento ao lançar um jogo completo sem permitir qualquer ponto ao adversário.
A lógica seria para manter mas em novembro a sua vida mudou, depois de ter sido diagnosticado com um cancro que o obrigaria a remover um dos testículos. «Durante uma consulta, o meu médico apercebeu-se de uma anormalidade e decidiu fazer testes adicionais. Na segunda-feira seguinte, fui diagnosticado com um cancro testicular e tive de remover um dos testículos no dia seguinte, a 29 de novembro», disse.
Plano de recuperação
Bettis foi apanhado de surpresa mas teve sorte. Quando os casos são diagnosticados numa fase inicial, a taxa de sobrevivência é de 99%. «Isto apenas reforça a minha crença de que temos de estar sempre sintonizados com a nossa saúde física e que fazer alguma coisa em relação a isso é o que faz literalmente a diferença entre a vida e a morte», disse.
O plano de recuperação não era longo. O objetivo era voltar a tempo de começar a treinar durante a pré-época (temporada da MLB arranca no início de abril) e, quem sabe, não chegar sequer a perder a carruagem do progresso que tinha vindo a demonstrar nos anos recentes.
Esta madrugada, praticamente nove meses depois, Chad Bettis voltou a jogar. Foi o lançador titular dos Colorado Rockies no jogo em casa com os Atlanta Braves. Durante sete innings, Bettis não permitiu qualquer ponto ao adversário mas também não conseguiu ir para casa com a vitória, uma vez que os próprios Rockies só conseguiram pontuar depois de Bettis ter sido substituído.
Não conseguir a vitória para a estatística foi acessório. O seu triunfo tinha sido outro. Desde o diagnóstico, o lançador foi pai pela primeira vez, derrotou o cancro e voltou a fazer o que mais gostava. E fê-lo sempre com um sorriso na cara. «Tenho a certeza que por dentro estava lixado, mas manteve-se sempre com muita energia positiva», referiu o colega de equipa Kyle Freeland na antecipação do regresso.
Um strike atrás do outro
Chad Bettis soube do diagnóstico durante um jantar de aniversário com a mulher, Kristina. «Nem sequer deixámos o restaurante. Ele é mesmo assim. Disse que íamos terminar o jantar e íamos ter uma noite fantástica. Há poucos como ele».
A remoção do testículo não resolveu definitivamente o problema. Em março, durante uma ressonância magnética, o cancro voltou a ser detetado em gânglios linfáticos. Bettis teve de ser submetido a novos tratamentos e, pelo meio, a mulher deu à luz.
A nova fase da sua vida deu-lhe a motivação extra que necessitava. Pode ter perdido o cabelo, mas ganhou uma filha. Pode ter perdido o início da época, mas ganhou uma onda de apoio que rebentou finalmente no regresso, num dos momentos mais comoventes da temporada.
Parar para respirar
«Só percebi que estava a fazer um grande jogo quando entrei para o quinto inning. Havia tantas emoções no ar. Estava a tentar controlá-las e, por isso, a demorar mais tempo do que queria», começou por dizer no final do encontro.
O treinador Bud Black, que não estava na equipa na temporada passada, não conseguiu evitar os elogios: «Depois de tudo o que me disseram sobre ele, não me espanta aquilo que fez esta noite. Tenho a certeza que foi muito emocional para ele, para a sua família, para as pessoas que lhe são próximas e para as pessoas com cancro que estão a seguir o seu trajeto».
O público (mais de 33 mil pessoas) fez questão de estar lá para o primeiro lançamento. Quando subiu para o relvado, a ovação foi arrebatadora. «Tentamos limpar tudo da nossa cabeça para nos concentrarmos no jogo, mas depois acontece aquilo. É inacreditável, tive de respirar fundo várias vezes».
A partir de agora, Chad Bettis deixou tudo para trás e concentra-se apenas em ajudar os Colorado Rockies a atingir um lugar nos playoffs. A tempestade passou, agora voltou a estar feliz, com tudo o que tinha há um ano e com uma motivação especial: uma filha prestes a fazer seis meses.
RPS