Billy McNeill. A incrível carreira do Leão de Lisboa
Venceu 31 títulos entre jogador e treinador ao serviço do Celtic mas nenhum teve um gosto tão especial como a conquista da Taça dos Campeões Europeus, no Jamor, em 1967. Ao longo de 18 anos como futebolista passou por altos e baixos, sempre pelo clube de Glasgow, e despediu-se com um total de 822 jogos. Pormenor interessante? Nunca foi substituído.
Quando se fala em jogadores com amor à camisola, há nomes que surgem sempre na primeira linha. A história de Paolo Maldini com o Milan é quase sempre o maior destaque, mas nomes como Ryan Giggs e Francesco Totti não lhe ficam muito atrás. Hoje, com a morte de Bill McNeill, o mundo do desporto parou para apreciar mais um exemplo de dedicação extrema.
William, mais conhecido por Billy, chegou ao Celtic em 1957, com apenas 17 anos, e não precisou de muito tempo para se aperceber de que a glória nem sempre se encontrava ao virar da esquina. O clube católico estava a caminho de uma série de oito anos sem conquistar qualquer título e viviam-se momentos de celebração para clubes como Rangers, Hearts, Dundee, Aberdeen e Kilmarnock.
A seca do Celtic alastrou-se a todas as provas e quis o destino que Billy McNeill cumprisse os primeiros oito dos 18 anos que esteve ligado ao clube sem qualquer troféu. A tendência era desanimadora e ninguém conseguiu prever quão brilhante o futuro seria.
O golo que marcou uma nova era
O primeiro sintoma de uma era épica chegou com a final da Taça da Escócia em 1965. Também aqui o jejum do Celtic era grande. O clube não vencia desde 1954 e já tinha perdido as finais de 1955, 1956, 1961 e 1963. A 24 de abril de 1965, no mês seguinte à estreia do lendário Jock Stein como treinador, McNeill saboreou pela primeira vez um triunfo. E de que maneira!
Curiosamente, McNeill chegou a estar em dúvida para a final no Hampden Park depois de ter sofrido uma lesão no gémeo durante o encontro anterior com o Partick Thistle. Mas, quatro dias antes do encontro, Stein decidiu inovar e anunciou o onze titular aos jornalistas. E McNeill constava da lista.
O jogo com o Dunfermline não se adivinhava fácil e a marcha do marcador comprova a ideia. Por duas vezes o adversário adiantou-se no encontro (Melrose 15’ e McLaughlin 43’), por duas vezes o Celtic conseguiu o empate (Auld 31’ e 52’). Foi preciso esperar pelo minuto 81 para a história começar a ser escrita. Com a assinatura de McNeill, claro está.
As ordens de equipa partiam do princípio que McNeill, como defesa, não ia à área contrária nos cantos, mas naquele instante Stein teve uma ideia luminosa e decidiu mudar. Resultado? Charlie Gallagher bateu o canto para a área e McNeill fechou o marcador de cabeça, garantindo o primeiro título na história do clube desde a Taça da Liga de 1957. Foi o primeiro golo do defesa na competição.
O cabeceamento de McNeill foi simbólico. De uma travessia no deserto, o Celtic prosseguiu para uma fase de grande bonança. Foi nove vezes campeão, em edições consecutivas, entre 1966 e 1974, venceu mais seis Taças da Escócia e seis Taças da Liga. O grande, e mais emblemático, momento aconteceu, ainda assim, logo em 1967, no Estádio do Jamor.
Leões de Lisboa imortalizados
Como em Glasgow dois anos antes, o Celtic até esteve a perder (Mazzola de penálti aos sete minutos), mas estava destinado a fazer história e tornar-se a primeira equipa escocesa – e britânica – a conquistar a Taça dos Campeões Europeus. Tommy Gemmell empatou aos 63’, Stevie Chalmers concretizou a reviravolta aos 84’ e o capitão Billy McNeill ficou imortalizado ao erguer o troféu em nome dos jogadores que passaram a ser conhecidos por Leões de Lisboa.
A cada ano que passava, tornava-se cada vez mais difícil dissociar o nome de Billy McNeill do Celtic. Quando decidiu terminar a carreira, em 1975, tinha já 35 anos e um total impressionante de 822 jogos pelo clube. A curiosidade extra mostra também que McNeill nunca foi substituído durante estes encontros, embora na altura a tradição das alterações estivesse apenas a dar os primeiros passos.
A ligação ao Celtic não se limitou às ações dentro de campo. A carreira de treinador de McNeill começou nos escalões de formação do clube e incluiu duas passagens pela equipa profissional, primeiro entre 1978 e 1983 e depois entre 1987 e 1991. Durante estas temporadas, acumulou mais quatro campeonatos, três Taças da Escócia e uma Taça da Liga.
Apesar das passagens no Aberdeen (vice-campeão e antecessor de Alex Ferguson), Manchester City (vencedor do segundo escalão) e Aston Villa, a ligação ao Celtic nunca esmoreceu e foi, sem grande surpresa, nomeado embaixador do clube em 2009.
Hoje, apenas um dia antes de se cumprirem 54 anos do golo decisivo na final da Taça da Escócia, o Celtic anunciou a morte da lenda. «A família do Celtic chora a morte de Billy McNeill, o maior capitão do clube e um dos melhores homens que jogaram e treinaram no clube, que morreu com 79 anos», pode ler-se num tweet.
Os últimos anos da vida de McNeill foram muito difíceis. Em 2017, a família confirmou à comunicação social que o antigo jogador sofria de demência. Contou que a concentração estava a ser afetada e, com ela, também a capacidade de comunicação e de discurso tinham sido perturbados.