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É Desporto

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26 de Julho, 2021

Ariarne Titmus. A mulher que interrompeu o legado de Ledecky

Rui Pedro Silva

Ariarne Titmus e Katie Ledecky após a prova

Katie Ledecky é uma potência da natação mundial. Durante os últimos anos, a sua hegemonia foi esmagadora. Quando saltava para a pista, já não era uma questão de ganhar, mas sim de por quanto o faria. Recordista mundial dos 400, 800 e 1500 metros livres, Ledecky teve uma experiência inédita em Jogos Olímpicos por culpa de uma nova sensação: Ariarne Titmus.

O currículo de Ledecky em Jogos Olímpicos é esmagador. Começou por vencer a prova de estreia em Londres-2012, nos 800 metros livres, e quatro anos depois, no Rio de Janeiro, fez o mesmo nos 200, nos 400 e nos 800 metros livres. Pelo meio, ainda foi medalha de ouro na estafeta dos 4x200 metros livres e prata nos 4x100 metros livres.

Por outras palavras, Katie Ledecky nunca tinha perdido uma prova individual nos Jogos Olímpicos e havia até quem equacionasse se o domínio da norte-americana neste estilo não era ainda mais consolidado do que qualquer um dos que Michael Phelps teve na sua carreira. Sim, o norte-americano pode ser o nadador mais completo da história mundial, mas Ledecky é (ou era) uma especialista longe, muito longe de toda a concorrência. Até chegar Ariarne Titmus.

A final dos 400 metros livres marcou o final de uma era. Katie Ledecky parecia estar a fazer uma prova à sua imagem: chegou aos 50 metros na terceira posição e a partir daí foi sempre primeira até à entrada para os últimos 100. Só que Ariarne Titmus nunca descolou e foi uma verdadeira sombra.

Titmus foi segunda praticamente toda a corrida mas percebeu-se que estava a encarnar apenas mais um dos múltiplos animais venenosos que existem na Austrália. Aproximou-se da presa, esperou o momento certo para atacar, lançou o seu veneno e ganhou a medalha de ouro, quebrando a hegemonia de Ledecky.

Ariarne Titmus tem 20 anos e a nasceu em setembro de 2000, em vésperas da edição que ficou marcada pelo domínio de um nadador australiano (Ian Thorpe). A rivalidade com Ledecky foi crescendo nos derradeiros anos e esta não foi a primeira vez que a derrotou, embora nunca tivesse acontecido num palco como este, onde todas fazem tudo para ganhar e planeiam a forma ao centímetro para não desperdiçarem a oportunidade.

Numa situação normal, Titmus sentia que não teria oportunidade de derrotar Ledecky mas nunca viraria a cara à luta. Em 2019, depois de ter infligido a primeira derrota à norte-americana numa grande prova desde 2013, Titmus anteviu o que poderia acontecer nos Jogos Olímpicos, com muita cautela.

«Se ela estiver ao seu melhor nível, não consigo derrotá-la, mesmo no melhor das minhas capacidades. Não sou boa o suficiente para derrotá-la no seu melhor. Mas vamos partir ambas do zero, será uma batalha dura e vai ser muito interessante. Nunca nado com medo contra ela, preocupo-me mais com o que serei capaz de fazer e sei que conseguirei ser boa o suficiente para vencer», disse.

Não se sabe como seria se a final tivesse sido disputada em 2020. A verdade é que um ano depois, o melhor de Titmus foi suficiente para derrotar uma Ledecky que até não esteve muito abaixo do que fez em 2016 para vencer a final com mais de cinco segundos de vantagem sobre a concorrência.

A aura de Ledecky sofreu um duro golpe porque o desporto é mesmo assim. E a natação não foge à regra. Os grandes dominadores têm prazo de validade e a Austrália e os Estados Unidos estão constantemente a formar novos talentos capazes de destronar quem lá estava. É a beleza da competição.