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É Desporto

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24 de Fevereiro, 2020

Lina Radke. A estrela dos malditos 800 metros

Especial Jogos Olímpicos (Amesterdão-1928)

Rui Pedro Silva

Lina Radke

Atletismo esteve vedado à participação feminina até Pierre de Coubertin abandonar o cargo de presidente do Comité Olímpico Internacional. Na estreia, em 1928, a vitória de Lina Radke nos 800 metros trouxe mais dissabores do que alegrias e provocou um retrocesso que duraria mais de três décadas.

O desporto continua a ser muito machista mas está muito melhor do que era na primeira metade do século passado. Pierre de Coubertin pode ter sido muito importante na recuperação do espírito olímpico mas foi um dos maiores responsáveis para manter as mulheres a aplaudir nas bancadas, sobretudo no que dizia respeito ao atletismo.

Foi preciso esperar até 1928, nos Jogos Olímpicos de Amesterdão, para haver provas femininas de atletismo. Curiosamente, foi a primeira edição depois de Coubertin ter abandonado o cargo de presidente do Comité Olímpico Internacional. As vozes divergentes continuavam a ser muitas mas qualquer progresso já seria significativo.

A edição de 1928 contou com cinco provas femininas: o salto em altura, o lançamento do disco, os 100 metros, a estafeta dos 4x100 metros e os 800 metros. Esta última prova foi aquela que maior burburinho provocou. Vivia-se numa época em que se achava que as mulheres tinham um lugar muito específico na sociedade… e não era a fazer desporto. E, mesmo neste campo, acreditava-se que havia limites para o esforço que podia ser feito.

A final olímpica nos 800 metros foi, infelizmente, um trunfo para os detratores. De nada serviu que Lina Radke, alemã que treinava para a distância há muito tempo, tenha batido o recorde mundial com um tempo de 2:16.9. O que ficou na memória de todos foi a forma como outras participantes foram obrigadas a desistir ou chegaram completamente exaustas à meta.

Há uma explicação simples. Eram poucas aquelas que tinham experiência nesta distância. Toda a edição dos Jogos Olímpicos fora um pouco experimental, no que ao atletismo feminino diz respeito, e este fenómeno nos 800 metros só deu mais força a quem acreditava que não havia espaço para as provas femininas.

Com a pressão a aumentar de tom, os responsáveis olímpicos acharam que não tinham outra solução a não ser excluir qualquer prova acima dos 200 metros no atletismo feminino. E assim continuou até 1960, em Roma, quando a soviética Lyudmila Lysenko sucedeu a Lina Radke com um tempo mais de 12 segundos mais rápido.

A evolução continuou a ser lenta, porém. Em 1960 a distância dos 800 metros foi a mais longa – e não havia prova de 400 metros. Foi preciso esperar até 1984 para haver pela primeira vez uma maratona feminina. O espírito olímpico propagou-se com uma velocidade muito maior do que a igualdade.