Frederick Lorz. «Ganhar» a maratona à boleia de um carro
Especial Jogos Olímpicos (St. Louis-1904)
O norte-americano foi o primeiro atleta a cruzar a meta na maratona olímpica de 1904. Foi saudado como o grande campeão e chegou a receber algumas felicitações mas a verdade veio ao de cima pouco depois: Lorz tinha desistido por exaustão e acabara por percorrer grande parte do percurso à boleia no carro do seu treinador. Foi apenas mais um insólito na história da prova.
Há quem considere que a maratona é a prova-rainha dos Jogos Olímpicos. Criada para agradar os gregos na edição inaugural em Atenas-1896, não precisou de tempo algum para se tornar também numa fonte inesgotável de histórias rocambolescas.
Na estreia, um grego chamado Spriridon Belokas percebeu que não tinha andamento para percorrer os mais de 42 quilómetros e fez uma boa parcela do percurso a bordo de uma carroça. Quando cruzou a meta, no terceiro lugar, pensou que a batota tinha surtido efeito mas as queixas dos adversários levaram à sua desqualificação.
Oito anos volvidos, em St. Louis, o progresso dos meios de transporte fez com que a carroça se transformasse num automóvel. Não foi preciso esperar pela meia-noite para acontecer o momento mágico, apenas pelo ponto de desistência de Frederick Lorz.
Há quem garanta – a começar pelo próprio – que tudo não passou de uma pequena piada. Depois de passar a marca dos 14 quilómetros, Lorz estava exausto e percebeu que não ia conseguir continuar a correr. Parou, deu sinal de desistência e aproveitou uma boleia do seu treinador durante mais de 17 quilómetros. Daí, a ideia seria andar até ao estádio.
Quando chegou ao estádio, o verdadeiro vencedor da competição – Thomas Hicks – ainda não tinha cruzado a meta. Por isso, cheio de bom humor (?), Lorz cruzou a meta como se estivesse a terminar a prova e foi saudado pelos presentes como o novo herdeiro de Spiridon Louis. Só mais tarde se percebeu que era, na verdade, uma versão moderna de outro Spiridon.
Lorz demorou a confessar o que tinha acontecido e começou por ver até onde é que conseguia levar aquela brincadeira. Chegou inclusivamente a ser fotografado ao lado da filha do então presidente dos Estados Unidos, Theodore Roosevelt. Depois, quando começaram a surgir as primeiras acusações, confessou a graçola e desviou as atenções para o verdadeiro campeão.
Houve quem não tenha gostado da iniciativa, a começar pela federação de atletismo amador. Lorz começou por ser banido de toda a atividade mas, mais tarde, depois de se justificar uma vez mais em como tudo não tinha passado de uma brincadeira, foi readmitido.
Fred Lorz não entrou para a história dos campeões olímpicos – não passou de uma nota de rodapé -, mas não deixou de ser um nome importante na maratona do início do século XX. Em 1905, no ano seguinte, venceu a mítica maratona de Boston com um tempo de duas horas, 38 minutos e 25 segundos.
O tempo do vencedor na maratona olímpica de St. Louis foi muito mais lento: três horas, 28 minutos e 53 segundos. E a história da prova não se reduziu à brincadeira de Lorz. Num período em que a maratona era uma prova insuportável para muitos dos participantes, Hicks foi obrigado a recorrer sucessivamente a copos de brandy com estricnina. Quando cruzou a meta, mal tinha consciência do que tinha acontecido.
O cubano Andarín Carvajal por seu turno foi direto de Nova Orleães para St. Louis para correr a maratona e, quando chegou, estava há 40 horas sem comer. Durante o percurso não resistiu a roubar umas maçãs de um pomar e acabou com problemas intestinais… embaraçosos.
Foi uma prova em estado puro. Para amadores, tal como Pierre de Coubertin tinha vaticinado.