O desastre europeu da RDA em 1982
Vitória do Magdeburgo na Taça das Taças em 1974 e derrota na final da mesma competição do Carl Zeiss Jena em 1981 tinham ajudado a pôr a RDA no mapa do futebol europeu, mas a temporada 1982/1983 teve um desfecho desastroso: cinco equipas participaram em competições da UEFA, nenhuma atingiu a segunda ronda.
Os tempos eram diferentes. É certo que havia duas Alemanhas em vez de uma mas a UEFA tinha apenas 33 federações. Havia União Soviética, Jugoslávia e Checoslováquia, três pesos pesados que tiveram dificuldades em manter as posições de poder a partir do momento da desintegração.
À entrada para a temporada 1982/1983, a RDA ocupava o sétimo lugar do ranking, com 29,450 pontos. A vizinha Alemanha dominava a Europa do futebol, com praticamente 52 pontos, enquanto Inglaterra, Holanda, Espanha, Bélgica e França ocupavam os postos intermédios. Portugal, com 21,750 pontos, estava num modesto 13.º lugar, imediatamente atrás de uma Itália que se mantinha à procura de uma nova vida, ainda em plena fase de rescaldo do escândalo dos jogos manipulados.
A verdade era esta: a RDA só tinha um troféu na sua história, num total de duas finais europeias, mas estava longe de ser uma federação fraca a nível de competições de clubes. Por isso, ninguém conseguiu prever o descalabro que a primeira ronda da temporada 1982/1983 iria ser.
O panorama nacional na RDA era dominado pelo Dínamo Berlim. A equipa que cresceu através de um apoio tácito da Stasi e do seu líder Erich Mielke estava em plena fase de hegemonia esmagadora – contra todas as críticas dos adversários às arbitragens e eventuais favorecimentos -, mas nunca conseguiu fazer a diferença contra adversários estrangeiros.
A história é intemporal. «Lá fora, com outros árbitros, fica mais difícil», acusavam os adversários. Aconteceu na RDA durante toda a década de 80 e em tantos outros países, inclusive Portugal, desde então. Na Taça dos Campeões Europeus, o Dínamo caiu aos pés do Hamburgo.
A equipa do norte da RFA era muito forte e o desfecho da eliminatória não constituiu necessariamente uma surpresa (até porque o Hamburgo viria a conquistar o título), mas nada era pior do que perder contra uma equipa de uma Alemanha que representava exatamente o contrário do que a RDA defendia.
Este não foi o único afastamento contra vizinhos na temporada. Na Taça UEFA, o Vorwärts Frankfurt ficou pelo caminho contra o Werder Bremen… no desempate. A equipa de Bremen venceu na RDA na primeira mão, por 3-1, e de nada valeu a resposta do Vorwärts na segunda ronda (triunfo por 2-0). No desempate, os golos marcados fora fizeram a diferença.
Se ser eliminado por adversários da RFA parecia ser a humilhação extrema, as três equipas restantes que representaram a RDA nas competições europeias nesta temporada não podem dizer que fizeram muito melhor.
Ainda na Taça UEFA, o Carl Zeiss Jena deixou fugir uma vantagem de 3-1 na primeira mão contra o Bordéus. Finalista da Taça das Taças dois anos antes, a equipa de Jena até podia ser vista como candidata a chegar longe, mas a hecatombe em França foi insuportável, com uma goleada por 5-0. Pior: Dieter Müller, da RFA, fez um hat-trick para compor a humilhação.
O FC Lokomotive Leipzig era claramente favorito contra o Viking. A Noruega ocupava o 25.º lugar do ranking e os desempenhos das suas equipas eram sempre escassos para fazer frente aos tubarões europeus. Ainda assim, conseguiram surpreender os alemães de leste na primeira ronda: 1-0 em casa. A segunda mão parecia adivinhar uma reviravolta que se começou a escrever na segunda parte. Liebers e Kühn desenharam o 2-0 com golos aos 56 e 61 minutos e os 13500 alemães nas bancadas pareceram respirar de alívio mas, à semelhança do que tinha acontecido em 1979 no RDA-Holanda, precisamente no mesmo estádio, a vantagem de 2-0 não foi suficiente.
O Viking chegou ao empate com golos aos 66 e 83 minutos e de nada valeu o 3-2 de penálti, marcado por Zötzsche, aos 86 minutos. Tal como o Vorwärts, a equipa caía no desempate por golos marcados fora de casa. E não seria a última.
O Dínamo Dresden foi a quinta equipa a entrar em ação, como representante da RDA na primeira mão da Taça das Taças. O B93, da Dinamarca (19.ª no ranking), parecia ser um adversário bastante acessível mas a vitória na primeira mão em casa (3-2) não deu grande conforto. Ainda por cima, uma vez mais, tinha havido uma vantagem promissora de 2-0 (Trautmann bisou com golos aos 8 e 15 minutos). Na segunda mão, o Dínamo pareceu ter a eliminatória na mão quando Pilz marcou aos dez minutos mas… a tradição negra da RDA tem muita força e o B93 concretizou a reviravolta na segunda parte (2-1).
Dez jogos depois, a RDA tinha ficado sem as suas cinco representantes nas competições europeias. No acumulado, tinham contribuído com apenas 1,8 pontos para o ranking e fizeram com que o país descesse para o 13.º lugar. O desastre é ainda mais percetível quando se percebe que apenas três outras federações ficaram de fora após a primeira ronda: Chipre, Luxemburgo e Malta.
A pressão interna tornou-se ensurdecedora: por todo o país chegavam petições a alertar os responsáveis para a forma como a preferência dada ao Dínamo Berlim estava a prejudicar o futebol nacional. Mas, neste caso, o Dínamo era só parte do problema.