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É Desporto

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05 de Setembro, 2019

O dia em que acreditar foi uma enorme desilusão para a Irlanda

Rui Pedro Silva

O ensaio decisivo de Lynagh

BBC escreveu no dia seguinte que «ninguém acreditava genuinamente que a Irlanda pudesse fazer frente à Austrália durante os 80 minutos». Mas pôde… e esteve perto, muito perto, de fazer cair a futura campeã mundial. No fim, o ensaio de Michael Lynagh foi um balde de água fria que Dublin não conseguiu superar.

Para que servem quatro minutos? No futebol, quatro minutos dão para muito pouco, embora grande parte dos momentos históricos que nos recordamos envolvam reviravoltas impressionantes – como a de Camp Nou em 1999 – que não precisaram de muito mais. Por outro lado, um vídeo de quatro minutos seria mais do que suficiente para mostrar as melhores corridas na carreira de Usain Bolt nos 100 metros.

O tempo é relativo. Até no desporto. Quando a Irlanda passou para a frente do marcador nos quartos-de-final do Mundial-1991, contra a Austrália, em Dublin, o cenário da maior vitória de sempre da seleção começou a pairar no ar. E não podia acontecer em melhor palco: estavam a jogar em casa, perante o seu público, num Mundial e contra uma das principais favoritas ao título.

Para a Irlanda, quatro minutos eram uma eternidade. Para a Austrália, parecia pouco. Muito pouco. Lansdowne Road ficou ao rubro aos 76 minutos do encontro quando Gordon Hamilton correu 40 metros praticamente sozinho para pôr a Irlanda em vantagem. Ralph Keyes converteu o ensaio e garantiu uma vantagem de três pontos: 18-15.

A corrida épica de Gordon Hamilton

Com o triunfo na ponta dos dedos, a ponta da língua quase não teve tempo para saborear aquele momento. A dois minutos do final, a Irlanda fez uma falta que daria a oportunidade de empate à Austrália. Mas Michael Lynagh foi ambicioso: os Wallabies estavam a vinte metros da linha de ensaio e decidiram partir em busca do triunfo.

As bancadas passaram da euforia à incredulidade em segundos. David Campese partiu determinado para o seu terceiro ensaio mas foi placado perto da linha de fundo e abriu caminho para uma nova fase, concluída com êxito por Lynagh. Assim, em tão poucos segundos, a Irlanda tinha deixado fugir a glória por entre os dedos.

Ensaio de Hamilton tornou-se nota de rodapé

«A equipa estava muito concentrada naquilo que tinha de fazer. Quando há situações de pressão, pensar na tarefa que se tem em mãos ajuda a pôr a importância do momento de lado. Cada pessoa na equipa pensou apenas no que tinha de fazer para executar o plano», contou Lynagh anos mais tarde.

E depois, o silêncio sepulcral. «Parecia fúnebre. Pensamos que há alguma coisa de errado mas depois percebemos que a multidão ficou em silêncio. Foi um grande alívio para nós», continuou o herói australiano.

Para Gordon Hamilton, que esteve muito perto de ser a estrela irlandesa, o desfecho foi devastador e alastrou-se ao balneário. «Foi mais um jogo que poderíamos ter ganhado e acabámos por perder», lamentou.

O triunfo serviu de catalisador para o título australiano. A forma como os jogadores reagiram à desvantagem e executaram o tal plano de que falava Lynagh tornou-se o mote para as fases seguintes. A Austrália bateu a Nova Zelândia na meia-final (16-6) e conquistou o primeiro título mundial da sua história ao derrotar a Inglaterra por 12-6. Para os irlandeses, 28 anos depois, continua a ser apenas mais um capítulo «do que poderia ter sido».