Even Pellerud. O homem que fez dos Mundiais femininos a sua praia
Não é invulgar haver um homem aos comandos das seleções de futebol feminino durante um Mundial. É certo que as mulheres estão a reivindicar cada vez mais esse papel mas, em três das sete edições organizadas para FIFA, a seleção campeã tinha um homem no leme.
Even Pellerud foi o primeiro homem a ser campeão mundial de futebol feminino como treinador. O norueguês, nascido em 1953 e com uma carreira modesta enquanto futebolista, assumiu o comando técnico da seleção do seu país em 1989 e, depois de ser o finalista vencido em 1991, levou a Noruega ao título mundial na Suécia, quatro anos depois.
A carreira de Even Pellerud como treinador confunde-se com o futebol feminino. Por mais do que uma vez tentou a sorte em equipas masculinas mas nunca sobreviveu para contar uma epopeia. Foi entre mulheres que se notabilizou e foi nas fases finais que construiu um legado que, por enquanto, continua a ser inatingível.
A consulta da lista de recordes do Mundial feminino não deixa margem para duvidar: Pellerud é um nome incontornável. Além de ter sido campeão em 1995, foi também o único a conseguir terminar nos quatro primeiros lugares em três ocasiões: vice em 1991 e campeão em 1995 com a Noruega, e quarto classificado com o Canadá em 2003.
Entre Noruega e Canadá, Pellerud fez das fases finais o seu habitat natural. Competiu com o país europeu em 1991, 1995 e 2015 e com o americano em 2003 e 2007. Ao contrário de outros nomes, que vão aparecendo e desaparecendo da ribalta, Pellerud manteve-se fiel e foi até agora o único treinador – homem ou mulher – a desempenhar essa função em cinco fases finais diferentes.
Não é surpreendente, então, que seja também o recordista de jogos (25), vitórias (16) e derrotas (7).
Um homem especial sem desculpas
Even Pellerud perdeu a final do Mundial da China, em 1991, para os Estados Unidos, comandados por Anson Dorrance. Quatro anos antes, a selecionadora norte-americana tinha ficado rendida à filosofia de Pellerud, depois de um confronto entre os dois países.
Os Estados Unidos aproveitaram o facto de a Noruega estar a ser afetada por uma onda de lesões para vencer 3-0. No final do encontro, Pellerud cumprimentou Dorrance e elogiou os pontos fortes que tinham permitido às americanas vencer o jogo.
«Ele tinha toda a legitimidade para utilizar as ausências para mitigar a derrota, mas não o fez. E nunca esqueci isso. Lembro-me de pensar quão forte era aquela mentalidade. Ele não era alguém para se queixar: ia detetar as fraquezas da equipa, corrigi-las e tentar vencer-nos da próxima vez. Essa atitude assustou-me imenso», admitiu Anson Dorrance em declarações para um livro de Tim Crothers.
A atitude de Pellerud ajudou a moldar a própria filosofia de Dorrance. E foi também este efeito que permitiu ao norueguês ter tanto sucesso durante a carreira de selecionador de futebol feminino.
E se o sucesso na Noruega era esperado – afinal estava a treinar uma das maiores potências -, o mesmo não se pode dizer do que conseguiu fazer ao serviço do Canadá. Na Escandinávia era a extensão de um modelo de sucesso, na América do Norte foi o pai de toda a evolução.
Os resultados do Canadá confirmaram que, além de selecionador de sucesso, era também um líder capaz de pensar no modelo a seguir em busca de resultados. Os apuramentos para fases finais, a qualificação olímpica e o quarto lugar no Mundial em 2003 acabaram com as hesitações: não se pode escrever um grande livro de futebol feminino sem mencionar o nome de Pellerud.