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É Desporto

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30 de Abril, 2019

Carolina Morace. Um ícone do futebol italiano

Rui Pedro Silva

Carolina Morace

Esta é a história da mulher que marcou o primeiro hat-trick na história de um Mundial. Aconteceu na China, a 17 de novembro de 1991, logo no segundo dia da competição. Taiwan era um adversário demasiado modesto e as italianas, mais experientes, não tiveram dificuldade em chegar à goleada por 5-0. Carolina Morace marcou os últimos três golos do jogo.

 

A história do futebol feminino italiano confunde-se com a da mulher que nasceu em Veneza a 5 de fevereiro de 1964. Num país que via o desporto-rei como ar para respirar, não surpreendeu que Carolina se tivesse dedicado desde cedo aos pontapés da bola. Aos 14 anos, como era muito habitual nos primórdios do futebol feminino, estreou-se na seleção durante um compromisso contra a Jugoslávia.

 

Carolina Morace tornou-se sinónimo de golos. Foi a melhor marcadora do campeonato italiano pela primeira vez em 1985, ano em que também entrou na história… dos Estados Unidos. Foi ela que decidiu o primeiro jogo de sempre da seleção norte-americana (1-0). Com carreira em clubes como Lazio, Reggiana, Milan, Verona e Modena, a avançada conseguiu médias sempre superiores a um golo por jogo.

 

Não é de espantar, portanto, que tenha sido a melhor marcadora da liga durante onze anos consecutivos, entre 1988 e 1998, e que tenha acabado a carreira com mais de 550 golos no campeonato. Se contabilizarmos o registo da seleção, com 105 golos em 150 encontros, percebe-se que Carolina Morace era, de facto, especial.

 

Mesmo antes de brilhar no Mundial da China – despediu-se com quatro golos –, Morace mereceu honra de destaque na Gazzetta dello Sport depois de marcar quatro vezes na goleada da Itália à Inglaterra (4-0) em Wembley, em 1990.

Carolina Morace fez história no Viterbese

Carolina Morace era tão importante no futebol italiano que em junho de 1999, já depois de terminar a carreira, aceitou o convite para orientar o Viterbese, equipa masculina que tinha acabado de subir ao terceiro escalão. A manobra do proprietário Luciano Gaucci, o mesmo que tinha recrutado o japonês Nakata e que viria a despedir Ahn, o sul-coreano que eliminou a Itália no Mundial-2002, não foi bem vista pelos adeptos.

 

O clube tinha acabado de subir e não estava interessados em golpes mediáticos. Queriam ter sucesso e sustentação. Os jornalistas também demonstraram resistência à inovação e Morace, conhecida por não ter papas na língua, fez questão de garantir que qualquer fracasso que tivesse não seria, certamente, por ser mulher.

 

«Descobri nos últimos dias que os homens italianos têm medo das mulheres. Tenho vindo a descobrir isso à conta das perguntas que me fazem», afirmou, distinguindo o tratamento que estava a receber quando comparado com o de outros treinadores.

 

Morace foi ainda mais longe quando abordou as suspeitas e rumores que andavam a circular no mundo do futebol. «Prefiro ser considerada uma lésbica do que uma puta. Não sou casada. Prefiro estar concentrada na minha carreira. Com quem vou para a cama só me diz respeito a mim e não devo respostas a ninguém sobre isso», atirou.

 

A «Baresi de saias», como também era conhecida, aguentou apenas dois jogos no Viterbese, abandonando com queixas de ingerência nas suas escolhas por parte do presidente, que incluíram a substituição da sua adjunta, Betty Bavagnoli, por um homem. Depois disso, partiu para uma carreira de sucesso no futebol feminino, na Lazio e seleções de Itália, Canadá e Trindade e Tobago. Atualmente, orienta o Milan.

 

A primeira mulher a entrar para o Hall of Fame do futebol italiano nunca deixou que os homens ditassem as regras por ela. E sempre foi mais do que alguém com ligações apenas ao futebol. Ainda durante a carreira como jogadora, terminou o curso de Direito em Roma e abriu um escritório para exercer, num período em que também já surgia frequentemente como comentadora televisiva.