Lyon. O drama no primeiro passo da hegemonia
O início do século XXI no futebol gaulês ficou marcado por constantes afirmações de superioridade de uma equipa que teve de esperar até 2002 para conquistar o título pela primeira vez. O Lyon tomou-lhe o gosto e foi heptacampeão em 2008, mas o primeiro ninguém esquece. Até porque obrigou a uma vitória dramática em casa com o líder Lens na última jornada.
É difícil ter idade suficiente para recordar o futebol da primeira década do século XXI e ignorar a hegemonia que o Lyon construiu em França com o desenrolar das temporadas. O clube pode ter chegado a 2002 sem qualquer título nacional mas, presidido por Jean-Michel Aulas e alimentado por sucessivas gerações de enorme qualidade, viu a estabilidade dar frutos e tornou-se num rolo compressor que não dava hipótese dentro de portas e que era presença assídua na fase a eliminar da Liga dos Campeões.
O segundo lugar do Lyon em 1995, dez pontos atrás do Nantes, foi um sinal efémero de que a equipa queria mais. Mas ainda não estava em posição de o conseguir. Nas temporadas seguintes, começou por ser arrastado para a mediocridade da classificação mas registou melhorias constantes, terminando em 11.º, 8.º, 6.º, 3.º, 3.º e 2.º.
Foi assim que o Lyon, na melhor fase na história do campeonato, entrou na temporada 2001/02. Muito do mérito deve-se a Jacques Santini, diretor desportivo entre 1997 e 2000 e treinador nas duas épocas seguintes. O plantel prometia: havia Coupet na baliza, os brasileiros Edmilson, Juninho Pernambucano e Sonny Anderson, o camaronês Marc-Vivien Foé e jovens talentos como Luyindula e Govou.
A expectativa era grande – afinal o Lyon ganhara a Taça da Liga na temporada anterior – mas a derrota no jogo inaugural, em Lens, esfriou o entusiasmo. A perfeição durante o mês de agosto, com quatro vitórias em quatro jogos, recuperou o ímpeto do Lyon e atirou-o para os primeiros lugares da classificação.
A liderança, porém, pareceu estar sempre longe de alcançar. Apenas por uma vez, depois de golear o Rennes (4-0) em casa, na nona jornada, o clube chegou ao primeiro lugar. Foi sol de pouca dura: nos três jogos seguintes, somou dois empates e uma derrota e caiu para a quarta posição.
O campeonato era a maior prioridade naquela temporada. O clube caiu nos oitavos da Taça da Liga e nos 16 avos da Taça de França, e na Liga dos Campeões foi terceiro num grupo com Barcelona, Leverkusen e Fenerbahçe. Atirado para a Taça UEFA, superou o Club Brugge, mas foi eliminado pelo Slovan Liberec nos oitavos.
Com todos os olhos postos no campeonato, a equipa voltou a ganhar posições e atingiu o segundo lugar na jornada 14, a 17 de novembro de 2001. E foi aí que se manteve até maio de 2002, na perseguição direta ao Lens, líder há 28 jornadas. Os dois clubes vinham de dinâmicas distintas antes de se defrontaram no Stade Gerland a 4 de maio. Nos cinco jogos anteriores, o Lens somara apenas cinco pontos; o Lyon fizera dez.
O jogo do título… literalmente
As duas equipas estavam separadas por um ponto – Auxerre e PSG já estavam longe para disputar o título – e o Lyon estava obrigado a vencer em casa para ser campeão. A cidade vivia um ambiente fantástico e 42 mil espectadores fizeram questão de marcar presença no jogo decisivo. Nada podia faltar.
A fome de títulos do Lyon – presidente, treinador, jogadores e adeptos – deu em fartura. Govou abriu o marcador aos sete minutos e Violeau aumentou a vantagem aos 14. Tudo parecia perfeito, não fosse o facto de o polaco Jacek Bak reduzir para o Lens aos 27 minutos.
A história de Bak merece uma nota de rodapé – ou talvez mesmo mais do que isso – na narrativa do título. O defesa sabia que seria sempre campeão francês, acontecesse o que acontecesse naquele dia. Bak começara a temporada ao serviço do Lyon e até marcara um golo decisivo na terceira jornada, no 2-1 na Córsega contra o Bastia. Mas, com o passar das semanas, perdeu espaço no plantel e transferiu-se para o Lens no inverno. Agora, ali estava ele de novo, a marcar o seu segundo e último golo no campeonato.
O golo reabriu a decisão do título mas o início da segunda parte voltou a ser dominador por parte do Lyon. Aos sete minutos do segundo tempo, Pierre Laigle fez o 3-1 e acabou com o nervosismo dos adeptos. Era uma questão de tempo até o árbitro apitar para o final do encontro e precipitar os festejos ansiados.
O Lyon tomou-lhe o gosto e não voltou a precisar de esperar tanto para festejar. No ano seguinte, a vantagem foi de apenas um ponto mas o título foi alcançado na penúltima jornada. Depois, aí sim, deixou de haver concorrência à altura. As diferenças pontuais foram aumentando: primeiro para três, depois para oito, 15 e 17. No ano do heptcampeonato, o sétimo e último título francês do Lyon até ao momento, a diferença foi de quatro pontos.
Chegava assim ao fim o período de maior hegemonia na história do futebol francês. Uma era na qual brilharam, além de Juninho Pernambucano, Sonny Anderson e Govou, jogadores como Essien, Malouda, Élber, Abidal, Benzema, Wiltord, Fred ou o português Tiago.