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É Desporto

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09 de Outubro, 2018

Nova Orleães. Acordar cedo para ir ver um jogo dos Saints

Rui Pedro Silva

Mercedes-Benz Superdome

O despertador toca de manhã. É hora de ir para o jogo, profissional, de futebol americano. As duas frases juntas fazem confusão. O desporto profissional em Portugal, com natural destaque para o futebol, é cada vez mais uma modalidade virada para a noite. Mas ali, em Nova Orleães, a mais de sete mil quilómetros de distância de Lisboa, ainda não tínhamos tomado o pequeno-almoço e já pensávamos que não nos podíamos atrasar para o jogo que tinha início marcado para o meio-dia.

 

(Publicado originalmente no atlas de bolso)

 

Atrasar nunca seria um problema. Por norma, gostamos de chegar bastante tempo antes e neste caso a vontade era ainda maior depois de todo o stress de quando fomos ver os New England Patriots. As portas da arena, historicamente importante por ter albergado milhares de pessoas durante vários dias durante o Katrina, abriam duas horas antes e nós estávamos preparados para isso.

A peregrinação até ao jogo

O transporte era praticamente direto desde casa. Havia um elétrico que parava a um quarteirão da arena e é impossível perdermo-nos quando há camisolas e adereços dos New Orleans Saints a cada metro. Vista de fora, a Mercedes-Benz Superdome parece uma obra de arquitetura futurista.

Arena vista de fora

O ambiente é de festa. Há bandas a tocar, mas o famoso tailgating deixa muito a desejar quando comparado com o Gillette Stadium. Afinal de contas, as pessoas tendem a ir de transportes para o jogo e os parques de estacionamento não são mais do que um pequeno espaço reservado a quem tem bastantes dólares para dispensar a troco de ficar a 30 metros da porta de entrada.

 

Fomos dos primeiros a mostrar bilhete. Foi simples: a lição estava aprendida e não houve surpresas desagradáveis como o famoso e desesperante episódio da mala de Foxborough. Há dezenas de elementos do staff espalhados pela arena que mostram toda a disponibilidade do mundo para tornar a nossa experiência ainda mais agradável.

 

Vamos diretos às cadeiras. Como procuramos sempre os bilhetes mais baratos, já sabemos que estamos num topo, perto das últimas filas. Quando lá chegamos, há pequenas toalhas – uma oferta muito usual no desporto americano – de incentivo à equipa. Olhamos em volta, absorvemos o espaço, tiramos algumas fotografias e… percebemos que talvez tenhamos chegado demasiado cedo.

 

Está na altura de ir conhecer o que a arena tem para nos oferecer, até porque ainda não comemos e queremos aproveitar a ausência de filas – por agora – para não ter de esperar muito. A oferta é variada e damos mais de uma volta à arena enquanto reunimos referências: há os habituais nachos e cachorros-quentes, mas também os batidos do Smoothie King (altamente recomendáveis) e sanduiches com salsichas de… crocodilo. Sim, às dez e meia da manhã.

 

Por esta altura, o burburinho é cada vez maior. As bancadas vão-se enchendo e vários jogadores vão aquecendo no relvado, ainda sem grande aprumo. Num dos ecrãs eletrónicos vamos assistindo à contagem decrescente até ao pontapé de saída, enquanto evoluímos de um “bolas, o que vamos fazer com tanto tempo?” para um “boa, já está quase!”.

 

O jogo, entre New Orleans Saints e Cleveland Browns, promete. Os Saints têm um tridente ofensivo de meter respeito, com Drew Brees, Alvin Kamara e Michael Thomas, enquanto os Cleveland Browns meteram fim a uma série de 17 derrotas consecutivas (mais de uma temporada na NFL) no fim-de-semana anterior. A equipa é jovem, tem muita gente com potencial mas insiste em vacilar nos momentos decisivos.

Drew Brees a preparar o ataque

A primeira parte foi uma desilusão. Houve poucos pontos, falta de inspiração e ataques descoordenados. O ambiente só ficava claramente escaldante quando os Saints conseguiam avançar dez jardas, soltando “Move dem chains!”como frase de guerra indicativa de nova fase de ataque ou quando se partia para o tradicional cântico associado aos Saints: “Who dat!”. A primeira experiência, logo no início do jogo, é esmagadora. A acústica é boa – não foi por acaso que Beyoncé deu lá um concerto na véspera da nossa chegada – e as vozes ecoavam naquela arena coberta.

 

Os Browns ameaçaram uma surpresa – Tyrod Taylor fez um passe para touchdown praticamente do meio-campo já nos instantes finais - mas os Saints fizeram um último drive decisivo que garantiu o triunfo graças a um field goal. Para a história, fica o desacerto do kicker dos Browns, que falhou quatro pontapés (dois após touchdowns e dois field goals) e impediu o triunfo da equipa de Cleveland. Resultado? Foi dispensado no dia seguinte.

Zane González teve um início de tarde para esquecer

Para nós, o que contou foi a experiência, mas houve quem tenha achado que estávamos pelo… inimigo. Por acaso, a Sarah estava com uns calções de tom alaranjado (eram vermelhos mas… muitas lavagens depois não há milagres) que se podiam confundir com as cores dos Browns. Na casa-de-banho, já depois do final, uma mulher abordou-a exatamente por isso: “Que cor é essa dos calções? Aqui nós somos pretos e dourados!”.

 

Tudo com fair-play, claro está. A vitória estava garantida e a pontinha de maldade que queria fazer mostrar não era mais do que uma brincadeira. A parte estranha? Quando saímos, ainda tínhamos metade do dia para aproveitar. Americanices...